O “amor à portuguesa”, luxuoso na paixão, “mas baratito” na carteira, é a base de “Palavras Cruzadas”, primeiro disco da colaboração entre David Bruno e Mike El Nite, transformados em David y Miguel, dupla de homenagem à música romântica.
O ‘casamento’ entre os dois artistas, com lançamento agendado para sexta-feira, já tinha ficado prometido em “Interveniente Acidental” – faixa do álbum "Miramar Confidencial" (2019) de David Bruno – e o resultado é uma viagem pelo país, exaltando não só quem cultiva o amor nos passadiços do Paiva, em Arouca, ou num motel, mas também quem cantou por ele nas décadas de 1980 e 1990.
“Quando me mudei para o Porto, foi o pretexto perfeito para fazer algo”, começou por explicar o lisboeta Mike El Nite à agência Lusa, dando assim o pontapé de saída ao projeto que levou para o centro da mesa “as referências comuns” de ambos, mas que têm como pano de fundo “Portugal, amor, férias e o apogeu da música romântica latina e portuguesa dos finais dos anos 1980 e inícios de 1990”.
No fundo, “é um disco com sabor a passatempo de férias, que são as palavras cruzadas”, resumiu.
“[Os duos de] música romântica são uma das principais influências do disco, em termos de estética e letras. É uma carta de amor a isso, mas também ao amor à portuguesa, mais baratito. Luxuoso, mas não muito caro. Um amor, não de estrada nacional, mas de um Itinerário Principal (IP) com SCUT. A isso, juntamos paixão, estilo, pouco dinheiro e a nossa cultura”, indicou por sua vez o gaiense David Bruno.
Ao contrário do que é habitual na obra de ambos, aqui perde-se uma noção regional para ganhar um ‘carimbo’ nacional, encontrando referências comuns por Portugal fora, “para manter a lógica da mesma temática”, mas que os dois pudessem “falar com alguma propriedade”.
“São sítios de todo o país, embora sejam reconhecidos localmente como uma coisa típica, porque já toda a gente passou ali férias e reconhecem os elementos. Além de zonas e regiões, o álbum fala também de situações e, nesse sentido, vai na linha dos trabalhos do David. Tal como a música sobre alguém pedir uma fatura com contribuinte não é de um local específico, mas faz parte da cultura portuguesa”, sumariza Miguel.
Os instrumentais vão na linha dos cantores românticos latinos e em “muito daqueles em que o Tony Carreira se ‘inspirou’”, aproveitando “a estética dos anos 1990, as duplas românticas como Lucas e Matheus ou Miguel e André”, enquanto as letras revelam “um amante bom e um amante mau”.
“Eu sou o amante mau e o Miguel é o amante bom. Ele sofre e chora [por amor] e eu sou o tangas que convida as miúdas para dar um passeio com conversa barata de engate. Há esses dois estilos”, explanou o gaiense.
Por seu lado, Miguel, de sobrenome Caixeiro – filho de Joaquim Caixeiro (Quinzinho de Portugal e membro da Brigada Victor Jara) –, revelou algo para lá dos sons ou das letras, que o fez questionar o que aconteceria se aplicasse a estética do ‘auto-tune’ às escalas de música pimba e “melodias pirosas”.
“O meu pai foi 'cantor pimba' durante um período da vida e sempre me quis descolar disso para me levarem a sério – além dessa realidade. Com a covid-19 e o tempo passado em casa a pensar nas coisas, questionei porque reneguei essa herança. Nesse sentido, redescobri as minhas memórias e raízes e esse imaginário onde há grandes artistas e músicos que são negligenciados pelo seu estilo, quando na verdade são grandes profissionais e lendas da música portuguesa”, vincou.
As apresentações ao vivo deste trabalho – que terão quatro elementos em palco – estão marcadas para 13 de maio, no Tivoli, em Lisboa, 02 de junho, na Casa da Música, no Porto, e 16 de junho, no Centro Cultural de Ílhavo, mas os músicos ambicionam levá-lo “ao maior número de sítios possível, porque é um disco que funciona em várias partes do país”.
O futuro da colaboração entre os dois vai ser o “público a decidir em último caso”, segundo David Bruno, mas garantiu que há uma vontade mútua em explorar o que ainda está por vir.
“Ainda temos muito por explorar. Este disco saiu com muita facilidade e fluidez, se o segundo for mais complicado não tem mal, isso pelo menos é normal. Já tinha dito ao David, por mim começamos já [no trabalho seguinte]. Mas vamos fazer os concertos e ver como o público reage aos temas para conhecermos o projeto do ponto de vista dos outros”, concordou Miguel.
O formato físico vai sair em breve e será algo “disruptivo”, no seguimento” do que ambos têm feito e “estará ligado com a temática” do disco.
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