Samuel Úria com Marcia - "Eu Seguro":

A dolente “Lenço Enxuto” fala-nos dos homens que são desajeitados a exteriorizar a tristeza, ao mesmo tempo que comove. E quem melhor que Manuel Cruz para cantar o tema mais carregado do disco? É ouvi-la com a disposição certa que a lágrima se ajeita para sair.

Miguel Araújo e António Zambujo (“Triunviriato”) e Jorge Rivotti (“O Deserto”) são outros convidados de renome que podemos encontrar no álbum. Para além do amor e do choro, a mensagem do álbum não é clara, mas parece sensato separá-la nestas vontades: recriminar o conformismo (sentimento expresso em “Pequeno Mundo”), enfatizar o “bem” (como a homenagem ao “Armelim de Jesus”, exemplo máximo de verticalidade) e promover a esperança e coragem para fazer face ao medo. Tudo sem sensacionalismos.

“Espalha Brasas” é o mais notório exemplo deste apelo ao fim do medo. “Lavra sulcos com a voz. E semeia. Não é mudo o adubo que espalharás”: estes versos conseguem ajudar a explicar, afinal, as razões por detrás da escolha do nome do álbum.

A preocupação em acrescentar ritmo à rima notou-se a espaços em alguns temas, mas é perfeitamente óbvia em “Forasteiro”, a mais entretida. Só com um soberbo jogo de cintura (e palavras) se consegue uma letra completa construída à base de aliterações e assonâncias que não cheire a farsa. Esta é também uma estratégia recorrente nas composições de Miguel Araújo (como em “Autopsicodiagnose”) e, bem concretizada – como o foi – provoca um efeito sonoro notável.

Se prestarmos o devido valor ao que Samuel Úria nos conta ao ouvido, ganhamos alguns bons conselhos. “O Grande Medo do Pequeno Mundo” não é nada menos que uma pérola e não se vão esquecer dele quando alinharem o top de álbuns portugueses deste ano. Ao “en garde!” do prelúdio, só há que responder “touché”.

@Pedro Pereira