Argumentos alterados e cenas apagadas: Hollywood é acusada de autocensura para permitir que os seus filmes cheguem ao gigantesco mercado chinês, revela um relatório divulgado esta quarta-feira (6) pela organização Pen America.

Argumentistas, produtores e realizadores fazem alterações de todos os tipos na esperança de ter acesso aos 1,4 mil milhões de consumidores da China, segundo esta associação norte-americana voltada para a defesa da liberdade de expressão.

Segundo a associação, esta autocensura vai da remoção da bandeira de Taiwan no blusão de Tom Cruise em "Top Gun: Maverick" até à exclusão da China como fonte de um vírus "zombie" no filme "WWZ: Guerra Mundial" com Brad Pitt, lançado em 2013.

Trata-se também de evitar tópicos sensíveis, como Tibete, Taiwan, Hong Kong ou Xinjiang, e não mostrar personagens pertencentes à comunidade LGBTQ.

"Apaziguar o governo chinês e os seus censores tornou-se uma maneira de fazer negócios como qualquer outro", diz o relatório.

Top Gun: Maverick

Pequim possui um dos mais rígidos sistemas de censura do mundo no departamento de propaganda do Partido Comunista Chinês, que decide se um filme estrangeiro pode ter acesso ao mercado local de filmes, que em breve será o maior do mundo.

Os sucessos de bilheteira americanos como "Avengers: Endgame" ou "Homem-Aranha: Longe de Casa" geraram mais receita na China do que nos Estados Unidos.

"O Partido Comunista Chinês realmente exerce uma enorme influência sobre a rentabilidade ou não de um filme de Hollywood, e os executivos dos estúdios sabem disso", salienta a Pen America.

Esta é a razão pela qual um ex-diretor da Disney, Michael Eisner, pediu desculpas a Pequim após a proibição no seu território do filme "Kundun", de Martin Scorsese, lançado em 1997, que retrata a vida de Dalai Lama, líder espiritual do Tibete no exílio.

Em Hollywood, algumas pessoas "apropriam-se voluntariamente dessas restrições sem serem solicitadas" e outras convidam censores chineses para as rodagens, denuncia o relatório.

"Se for apresentado um projeto que é abertamente crítico", existe o receio de que "você ou a sua empresa sejam abertamente colocados numa lista negra", disse um produtor.

"A abordagem de Hollywood de obedecer aos ditames chineses cria um padrão para o resto do mundo", alerta a Pen America, que lamenta que esse "novo normal" se esteja a consolidar em países orgulhosos da sua liberdade de expressão.