O filme “Ice Merchants”, do realizador português João Gonzalez, foi hoje premiado na Semana da Crítica, um dos programas paralelos do festival de cinema de Cannes, em França.

O filme de animação venceu o “Prémio Descoberta Leitz Cine” para curta-metragem, segundo a lista de premiados hoje anunciada.

“Ice Merchants”, terceira curta-metragem de animação de João Gonzalez, é um filme sobre um pai, um filho e uma casa num precipício, numa história cheia de metáforas sobre laços familiares.

“É um filme que tenta estudar os rituais humanos, as coisas pequeninas da vida, sendo uma base importante no relacionamento entre seres humanos”, explicou o realizador à agência Lusa, dias antes da ida a Cannes.

Com formação clássica em piano e em multimédia, João Gonzalez encontrou no cinema de animação o meio ideal para juntar a vontade de contar histórias e a composição musical.

“Eu tenho muito interesse em pegar nessas possibilidades que a animação permite e que na imagem real é mais difícil de alcançar. Uma coisa bonita da animação é podermos criar o cenário de raiz, e as regras de realidade onde a narrativa se vai passar, e jogar com estas metáforas visuais”, explicou.

O ponto de partida para “Ice Merchants” foi a imagem de uma casa numa montanha, debruçada num precipício. A partir daí desenvolveu a história de um pai e um filho, que produzem gelo na casa inóspita onde vivem, e de onde saltam todos os dias de paraquedas para o vender na aldeia, no sopé da montanha.

Além de “Ice Merchants”, na programação da Semana da Crítica estavam também os filmes “Alma Viva”, da realizadora luso-francesa Cristèle Alves Meira, e "Tout le monde aime Jeanne", primeira obra da francesa Céline Devaux, rodada em Lisboa e com coprodução portuguesa pela O Som e a Fúria.

Filme colombiano "La jauría" conquista Grande Prémio

O Grande Prémio da Semana da Crítica foi atribuído ao filme “La Jauría”, do realizador colombiano Andrés Ramírez Pulido, sobre o círculo vicioso da violência no país sul-americano.

"La jauría" retrata o quotidiano de jovens delinquentes e criminosos a quem um educador, Álvaro, tenta dar uma segunda oportunidade através de terapia de grupo numa casa abandonada no coração da floresta tropical.

Na atmosfera húmida e asfixiante da floresta colombiana, a "reeducação" dos jovens é mais uma prisão do que uma saída para o futuro.

Esta foi a primeiro longa-metragem do cineasta, depois de dois curtas, "El Edén" e "Damiana", selecionados e premiados em vários festivais internacionais.

"Quis contar muito com a imagem, na linguagem cinematográfica, para retratar a violência", explicou à France-Presse durante uma entrevista em Cannes.

Em todos os seus filmes, o realizador questiona a figura do pai: a sua ausência ou a sua presença nociva, da qual as personagens sofrem permanentemente.

"Os pais marcam a vida dos filhos, seja no abandono, seja na violência, ou seja no amor e na proteção", disse Pulido.

Ramírez Pulido mora em Ibagué, uma pequena cidade colombiana, onde a violência é um problema crónico.

Os dois jovens protagonistas de "La jauría", Eliú e "El Mono", destacam-se pela força da sua interpretação. Eles saíram das ruas e Ramírez Pulido só lhes pediu que atuassem como eram.

Mas o filme também exigiu semanas de ensaios, como tantos novos projetos que se destacam nas competições paralelas de Cannes.

A Semana da Crítica também deu um prémio especial Revelação à atriz francesa Zelda Samson, que interpreta uma menina de 11 anos vítima de incesto no filme "Dalva".

"Dalva" é também o primeiro filme da realizadora francesa Emmanuelle Nicot, que precisou de quatro anos e meio para desenvolver esta complexa história, na qual a violência sexual não aparece em nenhum momento, mas sim um doloroso processo de reconstrução emocional para Dalva (Zelda Samson).

A 61.ª Semana da Crítica, organizada pelo sindicato dos críticos de cinema de França, termina na quinta-feira.