
"Queremos que os filmes sejam feitos novamente nos EUA!", disse o presidente norte-americano Donald Trump, anunciando a intenção de avançar com tarifas de 100% aos filmes produzidos no exterior, para choque e consternação de hollywood.
Sem conhecer detalhes da medida, a América Latina aguarda o possível impacto com cautela e incerteza.
A enxurrada de tarifas de Trump sobre todos os seus parceiros comerciais alimenta um clima de preocupação nos mercados. Agora, também afeta a indústria do entretenimento, quando no domingo tentou controlar Hollywood e punir filmes produzidos fora dos EUA.
"Há questões processuais que não são claras porque, por exemplo, o que sabemos é que (...) as tarifas se aplicam apenas a bens e não a serviços. E na realidade, a produção audiovisual é um serviço", disse o premiado produtor argentino, Axel Kuschevatzky, à agência France-Presse (AFP).
Para ele, primeiro é preciso "entender se as medidas vão em frente" e "qual seria o alcance delas".
"Estamos numa fase anterior", disse Kuschevatzky, que participou da produção dos três últimos títulos argentinos nomeados ao Óscar na categoria atualmente conhecida como Melhor Filme Internacional: "O Segredo dos Seus Olhos" (vencedor), "Relatos Selvagens" e "Argentina, 1985".
O Brasil venceu a categoria este ano com "Ainda Estou Aqui", sobre a ditadura militar no país (1964-1985), um orgulho nacional que se espalhou pela região e chegou às bilheteiras dos EUA.
Marianna Souza, presidente da Associação Brasileira da Produção de Obras Audiovisuais (Apro), tem muitas dúvidas.
"Não sabemos se será um imposto aplicado apenas aos filmes exibidos em salas de cinema ou se também incidirá sobre produções exibidas em plataformas de streaming", disse à AFP.
"Mais barato" na América Latina

"Também não está claro se a medida se aplicará a produções feitas por produtores americanos, mas filmadas noutros países", acrescentou Souza.
A Colômbia, por exemplo, tornou-se um destino atraente para a produção cinematográfica internacional sob a proteção de regulamentações que promovem a atividade audiovisual.
Outra dúvida é se a medida será estendida para telenovelas e séries.
A Netflix lançou a adaptação do famoso romance "Cem Anos de Solidão", de Gabriel García Márquez, que ganhou o Prémio Platino de Melhor Série de TV no final de abril. É a ponta do icebergue das produções colombianas no extenso catálogo deste serviço de streaming.
"Netflix, Amazon, HBO e todas estas plataformas estão cada vez mais a produzir filmes e séries na Colômbia porque é mais barato do que fazê-los nos EUA. Sim, haverá um impacto", explicou à AFP Gustavo Suárez, professor de cinema na Universidade do Valle.
Entre "60% e 70%" da produção e rodagens na Colômbia "são administradas por estes serviços internacionais", indicou.
Realizadores americanos que chegam a países menores da região, como a Guatemala, têm um impacto mais percetível no mercado de trabalho.
Se as tarifas realmente entrarem em vigor, "as produções gringas [americanas] deixarão de vir e teremos menos empregos para os guatemaltecos, porque também não fazemos muitas produções nacionais", alerta Pamela Guinea, uma das principais produtoras de cinema da Guatemala.
Domina a cautela: o México, um dos principais músculos audiovisuais da América Latina, permanece em silêncio tanto na câmara privada da indústria cinematográfica Canacine como no estatal Instituto Mexicano de Cinematografia (IMCINE).
"Ainda é muito cedo" para comentar, disse uma fonte da indústria à AFP.
Definição "complexa"
Para o argentino Kuschevatzky, a própria definição de filmes "feitos nos EUA", que Trump procura defender, tem várias facetas.
Tem a ver "com o financiamento? Com quem é o dono da Propriedade Intelectual? Com onde é filmado? É uma definição complexa", disse.
Após Trump pedir ao Departamento do Comércio para iniciar "imediatamente" o processo de aplicação da tarifa de 100% sobre qualquer filme "produzido no exterior", o secretário Howard Lutnick respondeu nas redes sociais: "Estamos a trabalhar nisso".
Isto fez com que as ações de estúdios como Netflix, Disney e Paramount caíssem na bolsa.
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