20 anos depois da estreia da primeira edição do "Big Brother", a TVI volta a apostar no reality show para tentar recuperar a liderança que perdeu há mais de um ano, com a ida de Cristina Ferreira para o 'bairro' do lado, a SIC. Depois do adiamento devido à COVID-19, a nova edição que celebra os 20 do programa em Portugal arranca no próximo domingo, dia 26 de abril, depois do "Jornal das 8", e com muitas novidades, algumas impostas pela pandemia.
Foi em 1999 que Piet-Hein Bakker, responsável pela Endemol em Portugal, tentou vender o "Big Brother" à SIC. A estação de Carnaxide não quis avançar. A Endemol foi bater à porta da TVI e José Eduardo Moniz, diretor do canal, não hesitou e comprou o programa por um valor mais baixo, conta Felisbela Lopes, professora e investigadora da Universidade do Minho, no seu livro "20 anos de televisão privada em Portugal".
Quando foi apresentado a José Eduardo Moniz, "Big Brother" (BB) apenas tinha sido exibido na Holanda. Nos meses seguintes chegou à Alemanha, Espanha, Estados Unidos e Reino Unido, onde se confirmou o sucesso do formato.
2 de setembro de 2000 foi o dia que marcou um novo rumo para a TVI e para a televisão em Portugal. O canal de Queluz de Baixo renova a programação e estreia o primeiro reality show. "Não foi uma aposta arriscada porque a TVI não tinha nada a perder. Estava em terceiro lugar nas audiências", sublinhou Felisbela Lopes, ao SAPO Mag, em 2016, antes da estreia de "Casa dos Segredos".
Mas a aposta só se provou certa mais de um mês depois, a meio de outubro de 2000, quando o concorrente Marco deu um pontapé a uma colega. O regulamento do programa impunha a saída do participante da “casa mais vigiada do país”. E assim foi.
Nas 24 horas seguintes, a TVI centrou a programação no mais mediático pontapé da televisão portuguesa. No dia em que Jorge Sampaio anunciou a sua recandidatura a Presidente da República, o "TVI Jornal" e o "Jornal Nacional" abriram com um amplo destaque ao acontecimento do reality show, recebendo o concorrente expulso em estúdio e dedicando 16 peças ao tema (37% do tempo noticiário), revelou Margarida Martins na tese "Ética e Informação na TVI".
Quanto ao destaque dado nos noticiários da TVI ao "pontapé do Marco", o jornalista Henrique Garcia justificou, em declarações em novembro de 200o ao Diário de Notícias, dizendo que "não podíamos ignorar uma coisa que todo o país falava".
"Quando surgiu nos ecrãs da TVI em Setembro de 2000, o 'Big Brother' foi apresentado como uma das principais apostas de um canal que inaugurava uma filosofia de programação de raiz popular, procurando atrair o interesse do público através de programas que avançavam em direcção ao domínio privado. Num primeiro tempo, a SIC não atribuiu particular atenção a este novo filão de programação, mas cedo recuou, procurando, de várias formas, clonar as 'novelas da vida real' do canal quatro", escreveu Felisbela Lopes em "Novos rumos no audiovisual português: o reflexo do Big Brother na informação televisiva".
20 anos depois, uma edição especial e marcada por uma pandemia
Duas décadas depois da esteia na estação de Queluz de Baixo, será que os espectadores querem continuar a ver a novela da vida real? Em conversa com os jornalistas, Nuno Santos, diretor de programas da TVI, acredita que sim e que será o programa do ano. "O programa foi criado em 1999, entrou no ar no Holanda nesse ano e depois na maior parte dos mercados no ano 2000. Ganhou uma dinâmica global incrível este ano, com edições em muitas geografias e em muitos mercados. No nosso caso, isso não é diferente: nós olhamos para o 'Big Brother 2020' como um programa de televisão muito marcante, muito presente na vida das pessoas. E eu, conhecendo oferta que existe, isso é uma verdade pré-pandemia, é uma verdade agora durante a pandemia, isso na minha perspectiva. O 'Big Brother" vai ser o programa mais marcante de 2020 e isso não mudou. Muitas coisas mudaram nas nossas vidas, em geral, e algumas no programa também, mas isso não mudou", frisa em conversa com o SAPO Mag e com um pequeno grupo de jornalistas através de videochamada.
"Entre géneros, produtos em concreto, muitas vezes, temos no mercado televisivo este tipo de ondas. Um pouco como na moda: o que hoje parece uma coisa extraordinária depois desaparece e ao fim de 'x' anos volta. Agora voltou, mas de forma distinta daquilo que era na sua origem. O 'Big Brother' de 2000, que acompanhei a partir da SIC, onde estava na altura, foi um programa absolutamente revolucionário, mas o 'Big Brother' tinha muito operadores de câmara a filmar os concorrentes. O 'Big Brother 2020' tem 58 câmaras, ou 54, já estou aqui um pouco perdido, inteiramente robotizadas e controladas a partir de uma régie por um número muito restrito de pessoas", revela o diretor de programas da TVI sobre as mudanças no reality show.
Nuno Santos acrescenta ainda que a base do "Big Brother" continua inalterável, o que mudou foi o "seu dispositivo tecnológico": "A vida mudou nestes últimos 20 anos e, portanto, as sociedades têm hoje preocupações que não tinham, o país é hoje diferente do que era no ano 2000. E as pessoas, de certa maneira, acompanhando essas mudanças que é global, também mudaram aquilo que dizem, pensam e verbalizam, no acesso que têm ao ensino e à tecnologia, nas angústias que tinham, ou tinha outras, e agora não têm. Nesse sentido, há uma base que é a mesma e a base é: 'eis um conjunto de pessoas que não se conhece até determinado momento e que vai ter de conviver no mesmo espaço durante ‘x’ tempo'".
Uma quarentena televisiva
Apesar da base se manter a mesma, a nova edição do "Big Brother" vai arrancar de forma diferente do habitual devido à pandemia da COVID-19. A partir de domingo, na TVI, os espectadores vão poder acompanhar a "primeira fase" do reality show, que será uma espécie de "quarentena televisiva". Segundo Nuno Santos, no "BB Z0om", os concorrentes vão estar isolados durante 14 dias, tal como é recomendado para Direção Geral da Saúde.
Veja o teaser:
Na primeira fase do reality show, os participantes vão estar em quarentena, cada um num apartamento - uma espécie de aparthotel. Os participantes não terão acesso ao mundo exterior e só poderão conversar através de aplicações. "Este 'Big Brother' tem dois andamentos: um primeiro a que nós chamamos 'BB Zoom', que começa dia 26 de abril, e que acompanha a vida dos concorrentes na sua quarentena, no seu confinamento e que gera conteúdo a partir daí, que gera interação entre ambos e que é um programa de televisão; e um segundo, mais convencional, a partir de 'x' dias à frente, quando as pessoas, que entretanto já se conhecem (mas não fisicamente), se encontram todas na casa", conta o diretor de programa da TVI em conversa com o SAPO Mag.
"Uma das frentes do nosso trabalho foi salvaguardar a integridade dos concorrentes e agora vamos sujeitá-los a um período de quarentena rigoroso, um trabalho acompanhado por uma empresa certificada, que vai monitorizar e garantir que tudo está a ser feito de acordo com as instruções da Direção Geral da Saúde", explica.
O diretor de programas sublinha ainda que "não há nenhum problema de saúde" com os participantes. "Nós temos que ter a certeza absoluta que, no fim dos 14 dias, e efetuados os testes, não há mesmo um problema de saúde com eles. Por exemplo, qualquer um de nós que está aqui aparentemente não tem nenhum problema de saúde, não tem nenhum sintoma e, no entanto, nenhum de nós tem a certeza absoluta que não esteja infetado", conta.
COVID-19: Concorrentes vão fazer dois testes
"Serão sujeitos a dois testes durante esse período. Nós precisamos ter a certeza absoluta que no momento em que eles entram todos na casa, todos estão em perfeitas condições de saúde. Nenhum deles está infectado", explica Nuno Santos, acrescentando que "ao fim de X dias entram na casa".
"O que precisamos de garantir é que no momento em que entram em casa, todos estão em perfeitas condições de saúde, que nenhum deles está infetado, que todos estão limpos. O próprio ato do teste é uma forma de mostrar aos espectadores que aquela pessoa está em condições de participar num programa de televisão em que vai interagir fisicamente com outras pessoas. Nós temos de ter a certeza, os espectadores têm de ter a certeza e ver é sempre a melhor forma", sublinha Nuno Santos em conversa com os jornalistas.
Já entrada na casa mais vigiada do país deverá acontecer no final das semanas de quarentena. "Fizemos uma complementaridade entre as duas fases justamente porque elas são distintas. O que acho é que se nós há dois meses disséssemos a alguém 'olhem, o arranque do programa é nos primeiros tempos eles estão todos num aparthotel e falam todos uns com os outros... sem ser através um contacto físico mas através das tecnologias'. Alguém diria que 'isso não faz sentido'. Hoje se calhar não é verdade dizermos isso porque é assim que a vida tem decorrido", acrescentou.
Cláudio Ramos, que também marcou presença na 'mesa redonda', via Zoom, acredita que os espectadores vão olhar de forma diferente para o reality show. "Acho que qualquer pessoa vai olhar hoje para este formato com olhos que não olharam para outras edições. Porque hoje por circunstâncias da vida, voluntaria ou involuntariamente, todos nós tivemos de ficar em confinamento. A uns custa mais, a outros custa menos. A partir de agora qualquer reação que um participante/ concorrente tenha dentro da casa nós em vez de apontarmos o dedo imediatamente vamos pensar ‘ah, espera, eu se calhar também podia ter feito isto durante aquelas semanas em que estive com a minha sogra em casa ou a minha mulher 24 horas. Acho que, em termos de experiência, com o que estamos a viver, vamos olhar com outros olhos para aquilo para aquilo que os concorrentes fazem dentro da casa", defende o apresentador que se estreia no próximo domingo como apresentador do "Big Brother".
"Acho francamente que isto vai fazer os espectadores olharem para o formato com outros olhos, mais próximo da realidade", acrescenta.
Cláudio Ramos: de concorrente a apresentador
Cláudio Ramos será o primeiro ex-concorrente a ser o anfitrião do reality show. Em Portugal, até agora, todas as edições do "Big Borther" tinham sido apresentadas por Teresa Guilherme.
Em conversa com o SAPO Mag, em março, o apresentador confessou que "apresentar este formato era um objetivo de carreira, um sonho". "Fascina-me o facto de eu já ter estado lá dentro. Fascina-me porque é um programa que interage com pessoas, é uma experiência onde tens as pessoas dentro da casa 24 horas por dia e onde podem mostrar as suas personalidades. É uma coisa absolutamente extraordinária lidar com este fenómeno e eu sempre gostei. Sempre vi, vi no estrangeiro, vi em Espanha, no Brasil, em Itália. É um formato que eu gosto e acho que é um formato onde o apresentador é posto à prova em várias formas, de várias maneiras, na mesma gala. E eu, como apresentador, aos 46 anos, sinto que posso e devo passar por isto nesta altura da minha carreira", contou.
LEIA AQUI A ENTREVISTA DE CLÁUDIO RAMOS AO SAPO MAG
"O maior desafio é tu esqueceres que há tudo isso à tua volta. É tu perceberes que vais fazer um programa de televisão que tem a importância que tem, mas que tu és a pessoa escolhida para o fazer. Mas és apenas a cara de um formato gigante, com montes de pessoas envolvidas. As estrelas são os concorrentes, não é o apresentador. E há muitas coisas a acontecer e tu tens o peso de deixar tudo isso de lado e de estar focado só no que é importante", frisou Cláudio Ramos, que contará com Mafalda Castro, Maria Botelho Moniz e Ana Garcia Martins (A Pipoca Mais Doce) na equipa.
Na entrevista coletiva, o apresentador frisa ainda que o "Big Brother" é "um grande formato, com COVID ou sem COVID". "Já acreditava há 20 anos, acredito muito mais nele agora. Sou um fã do formato. E se tens uma maior proximidade com o produto que te estão a oferecer através da televisão, é natural que tu recebas melhor em casa", defende.
Os concorrentes
Na primeira fase, no "BB Zoom", os concorrentes vão apenas interagir através de aplicações. Depois da quarentena é que entram na casa mais vigiada do país.
As pistas e as identidades dos participantes do reality show estão nos segredos dos Deuses, apenas Cláudio Ramos tem conversado com eles e assim continuará a ser nas primeiras semanas do reality show da TVI. "O Cláudio tem o papel principal, é que lidera o programa de domingo. Ele é a única pessoa da equipa do ‘Big Brother’ que fala com os concorrentes, que lhes mede o estado de alma, que os questiona, que os questiona uns sobre os outros, e isso é verdade nas duas fases do programa. Mesmo nesta primeira fase há uma espécie de confessionário", explica Nuno Santos.
"Vamos ter os concorrentes que queríamos ter, isso é o mais importante", frisa o direto de programas, explicando que os concorrentes terão entre "os 20 e poucos anos e os 40 e tantos" e de vários locais do país.
Veja o teaser:
"Nós escolhemos sempre um grupo relativamente mais alargado do o número dos que vão entrar no programa, exatamente para eventuais desistências, problemas físicos, por aí fora. Portanto, nesse grupo mais alargado – essas pessoas não sabem que vão ser concorrentes, só sabem que podem ser concorrentes; sabem que chegaram à reta final –, houve duas pessoas que, por circunstâncias pessoais e foi pré-pandemia disseram 'eu não posso estar'. Nenhuma era do nosso grupo principal. Isto também tem uma explicação, que entendi melhor agora, mas que já sabia do passado... muitas vezes, as pessoas candidatam-se quase por impulso ou por algum incentivo de um familiar ou de amigo ou às vezes até por brincadeira, digamos assim. E quando estão à beira de entrar no programa, espera lá: ‘eu tenho um negócio aberto e não posso estar três meses fora’ ou ‘tenho um compromisso familiar e eu não posso evaporar-me durante 'x' tempo", explica Nuno Santos.
Reality show na televisão e online
A primeira fase do "Big Brother" arranca domingo, dia 26 de abril, na TVI, com Cláudio Ramos. Ao longo da semana, todos os dias, haverá um diário às 19h00 e outro "por volta da meia noite". Ao sábado, o canal vai emitir um especial com os melhores momentos da semana.
Paralelamente à emissão televisiva, a estação de Queluz de Baixo vai apostar em conteúdos online. "Hoje um conteúdo desta natureza tem uma vida digital que pura e simplesmente não existia há 20 anos. Portanto, tem que ter uma vida na televisão tradicional e uma vida no digital, e elas são complementares", explica Nuno Santos. "
"Há uma coisa evidente que quero reforçar: seremos complementares. Há conteúdos que nascem num lado e migram para o outro", garante. "Seremos muito sensíveis àquilo que for ditado pelas tendências do digital. Ou seja, olhar com atenção para aquilo que se diz nas redes", revela.
"Os conteúdos vão ser sempre complementares. Há uma coisa que gostava de partilhar: as pessoas da televisão tradicional, as produtoras e os responsáveis, têm uma ideia de que há uma linguagem que é do digital e que não é da televisão. Reparem como a pandemia ditou uma alteração muito significativa disso aqui num mês e qualquer coisa. Nunca se viram tantos programas, incluindo os noticiários principais, com comentadores, analistas, especialistas a entrarem por Skype, WhatsApp, Zoom, por não sei o quê. No passado fim de semana tivemos à escala global um evento [One World: Together at Home] em que todos os protagonistas estavam nas suas casas. Portanto, aquilo que eram os meios pesados que às vezes as pessoas da televisão julgam que é necessário para captar, equipas com não sei quantas pessoas, assistentes disto e daquilo… talvez seja mais simples fazer televisão do que se pensa. Além de que o público está mais disponível para consumir determinado tipo de imagens, de linguagem", explica Nuno Santos.
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