Questionado sobre as origens e o desenvolvimento das suas aptidões artísticas, Johnny respondeu:

"A minha primeira paixão da vida sempre foi o cinema. E através do cinema eu encontrei a música! Na adolescência a música chegou com mais força. Nessa fase, pelo meio musical, é geralmente quando se encontra melhor o seu grupo e as pessoas com as quais se identifica. Mas, eu me lembro que um grande ponto de virada da minha percepção foi assistir ao filme 'Na cama com Madonna' e ver essa mulher incrível, livre, provocadora, viajando o mundo com a sua trupe de dançarinos, gays, lésbicas... Todo mundo junto ali provocando e questionando os tabus, a igreja e a sexualidade.

Eu recordo de ter assistido a esse filme com 7 anos de idade. O 'meu queixo caiu no chão' assim... Aí eu falei: nossa, o que eu quero fazer é isso! Quero viajar o mundo com a minha trupe diversa, provocando e questionando as coisas também.

A partir disso, acho que a arte entrou muito em minha vida com um papel de questionamento, mesmo, de provocação. Como dizia James Baldwin: "os artistas estão aqui para perturbar a paz!". Claro que é também para a gente dançar e se divertir, mas também é para ser chacoalhado, né?! Tipo: 'e agora, o que é que a gente faz?!'

O caminho civilizatório, penso que ele passa muito pela arte. Pela reflexão e por todo o sentimento que ela desperta na gente. Então eu diria que 'Na cama com Madonna' abriu os meus olhos, porque ali ela estava fazendo um show que era teatro, era cinema... Eram tantas coisas! Coisas que estavam mexendo diretamente com a política e com a sociedade.

Vi ali algo próximo de uma coisa que eu possa dizer que é religioso para mim!

Para cantar o processo foi bem autodidata. Lá na raiz desse meu desenvolvimento estava a Mel C das Spice Girls. Eu me identificava com a voz dela, porque ela também tem uma voz 'meio metálica'. Aí depois, quando eu já estava começando o meu trabalho solo, Amy Winehouse. Para mim ela é a cantora do século! Uma voz 'super metálica e rasgada' também. E no Brasil foi a Cássia Eller. Eu a vi cantando no Rock In Rio, botando o peito para fora e tal... Pensei: "essa mulher é revolução!"

Quando os meus primeiros sons saíram, tinha quem achasse que era algum 'material perdido' dela. Acharam que poderiam ser músicas que ela nunca tinha lançado antes ou algo assim. Penso que isso tem muito a ver com essa nossa 'voz metálica'."

Já sobre os dois anos de atividades suspensas devido à pandemia de coronavírus e também em relação à crise política desencadeada pela ascensão da extrema-direita no Brasil, o cantor e ator relatou:

"Foi um momento em que tivemos que nos adaptar. Precisei montar um estúdio no meu quarto e finalizei o disco como pude, 'Do it Yourself' total, em um momento de terror absoluto! Como eu disse no show, perdi um amigo da minha faixa de idade. Então a gente não sabia se iria sobreviver! Todo dia era uma crise de pânico!

E eu acho que esse lugar do medo, ele não é muito produtivo. Então a pandemia não foi muito produtiva. Essa questão política no Brasil não ajudou também, só aumentou o medo. Não foi um governo que respondeu a tudo isso de uma maneira coordenada, ainda mais em relação às vacinas. Só deu a entender que era mesmo cada um por si... E quem sobreviveu, sobreviveu.

Houve aquilo de o governante do país dizer que era só "uma gripezinha". Além de imitar as pessoas morrendo com falta de ar, depois de deixar Manaus deliberadamente sem estoque de tubos de oxigênio. Milhares de pessoas morrendo... Isso é uma guerra. Eu nunca imaginei que fosse viver uma guerra. E esta é uma guerra mundial contra esse vírus maldito, que, no Brasil, foi muito piorada por essa situação política.

Então esse período não foi muito produtivo para mim, foi mais um lugar de medo mesmo, sabe? E a volta tá sendo complicada também, porque o que a gente vê no Brasil é um cenário de terra arrasada.

Perdemos muita gente que não precisava ter morrido. Paulo Gustavo, por exemplo. Isso aconteceu pelo atraso na aquisição das vacinas. O Governo Federal ignorou mais de 50 emails e retardou a chegada das vacinas no Brasil. Uma dose, quando saíram aqueles primeiros lotes, poderia tê-lo salvado.

Tudo que esse governo sabe fazer é matar.

Extinguiram o Ministério da Cultura, aparelharam todas as fundações de cultura, de música e de artes visuais. Estão minando tudo isso. E o incêndio na Cinemateca não foi por acaso, é devido a um descaso que vem desde o Temer.

A minha mãe, inclusive, tem um filme que estava guardado lá, o qual escapou... Ainda bem! Ela é diretora de cinema. Fez um curta que estava lá, em película.

Estamos vendo a nossa memória e a nossa história sendo destruída. E eles, que fazem parte dessa governança, riem. Eles têm um prazer sádico de causarem danos à classe artística. É um sadismo jocoso!

Porém, em nosso país há potencial para termos uma das indústrias culturais mais poderosas do mundo. Porque é um país muito diverso, muito rico... E muito foda! A gente é muito foda, porra! A nossa música é muito foda!

O ruim é que tudo isso fica só no potencial, porque não existe política pública junto de iniciativa privada para jogar isso para fora e expandir.

Em governos anteriores tinha. Teve até 'dia do Brasil' na França, nos Estados Unidos... Gilberto Gil levava a música brasileira a fim de ela ganhar uma proporção cada vez maior mundo afora.

Hoje não se tem mais nada disso. É necessário um despertar da população em geral, porque o povo brasileiro é levado a acreditar que arte é vagabundagem e que cultura não gera emprego. Quando, na verdade, a cada real investido na Lei Rouanet, quatro ou cinco voltam para a sociedade. Isso gera emprego e movimenta a indústria."

Por fim, Hooker deixou uma dica para os colegas das artes que estão trabalhando em projetos neste momento:

"Se você sabe que o seu trabalho tem uma coisa única, algo que só você tem, invista nisso. Porque é isso que o vai salvar. Não queira se homogeneizar, não queira ficar parecido com os outros. Seja você mesmo, porque todo mundo é uma amálgama de um tempo, de um lugar e de uma mistura cultural.

Foi isso que me levou para a frente, um trabalho que é a minha cara. Eu sou um gótico do Recife antigo que assistia aos programas de brega à tarde e que também ia para o carnaval. Absorvi toda essa cultura: o frevo, o maracatu e o brega. Mas, ao mesmo tempo, eu era gótico... Uma mistura única no tempo e no espaço.

Uma última dica para quem está iniciando uma jornada artística é: fale da sua 'aldeia' que você estará falando do mundo. Quando se fala de assuntos universais e se toca aí pelo mundo, às vezes as pessoas não sabem ao certo do que se trata, mas elas sentem! É isso!"