Em entrevista à agência Lusa, em Lisboa, os músicos recordaram que se conheceram na capital portuguesa, no final de 2018, num concerto da banda brasileira 5 a Seco, no qual Paulo participava e ao qual Janeiro tinha ido assistir.
Esse momento “foi o início de uma amizade enorme, e dessa parceria [musical] que não começou logo em termos de canções, composição e produção”.
“Primeiro foi a parte orgânica, de nos conhecermos e de ficarmos amigos. Depois começaram a fluir canções e a nascer letras e a partilhar mentalidades”, contou Janeiro, partilhando que a “grande união” entre os dois é mesmo a forma como veem o mundo.
“Ambos achamos raro encontrar pessoas que pensem da forma que nós pensamos, quer a música, quer a forma como olhamos para o mundo ou para a indústria da música”, disse.
A ‘faísca’ para o início do projeto deu-se no Teatro da Garagem, em Lisboa, onde estavam a compor. Logo ali decidiram gravar um trecho de uma música acabada de criar, mas foram impedidos, “interpelados por um segurança, com uma atitude meio agressiva”.
O momento levou-os a refletir sobre “a ‘protocolaridade’ do sistema e como esta burocracia, que é 'super importante', impede de ter uma organicidade no momento presente e no que é o fluir da vida normal”.
Essa rigidez face ao estabelecido faz com que “fique tudo tão standardizado e higienizado que acaba por colocar tudo dentro de uma caixa, e as pessoas acabam por ir sempre àquela caixa e ver ou fazer sempre a mesma coisa”.
“Na Arte isso faz com que as 'nuances' da vida acabem por não sair cá para fora”, defendeu Janeiro, com Paulo a lembrar que a Arte “é o oposto disso, é fluida”.
“Não somos contra o fim do protocolo, só a favor do afrouxamento de coisas muito rígidas, para que a vida possa ser mais leve”, referiu o músico brasileiro.
O processo de criação do álbum, tal como o do anterior, fugiu também ao ‘protocolo’.
Os dois isolaram-se durante alguns dias em Avaré, no interior de São Paulo, onde vive a família de Paulo Novaes, sem pressões nem metas estabelecidas. O mesmo tinha acontecido para o álbum anterior, mas em Coimbra, terra natal de Janeiro. Desta vez, no Brasil, o resultado de dois dias imersos na música foram 14 canções, das quais onze compõem o alinhamento do disco.
Em termos musicais, “Protocolar, Volume 2”, uma edição de autor, é “um equilíbrio” entre o gosto de Paulo Novaes pelo rock e a música de Thom Yorke, vocalista dos Radiohead, e o gosto de Janeiro pela música de Rosalía e de como a cantora catalã “mescla as várias referências”.
Além disso, há também um pouco de Frank Ocean, “que está sempre presente”, e uma outra “referência curiosa”, o álbum "Weightless", de Marconi Union, no qual o músico “brinca com uma série de frequências”.
Janeiro e Paulo Novaes criaram a sua própria frequência e acabaram por “pegar nela e construir o álbum sobre a mesma tonalidade, que era a que já vinha do final de ‘Protocolar, Volume 1’ [editado em janeiro de 2020]”.
“Conseguimos que haja uma conexão entre o final do primeiro volume e o início do segundo, e que toda a viagem possa ser lisérgica, e não só protocolar, no sentido de 'singles'”, referiu Janeiro.
Embora as canções que compõem “Protocolar, Volume 2” sejam “bem diferentes a nível de forma”, visto serem “não protocolares, meio mantras”, Paulo Novaes admite que no meio do álbum “há um 'single' muito protocolar, ‘Vida lá fora’”.
“As outras canções são a provocação de trazer a pessoa através de sons lisérgicos, texturas, para que consiga embarcar nesta viagem e desligar um pouco essa chave da correria do mundo”, disse.
Neste álbum, salientou Janeiro, os músicos propõem “uma viagem com mais tempo, e à antiga”, no sentido de se ouvir o disco do início ao fim.
Mais tarde, querem editar um álbum “só em mantras”. “Porque queremos também trabalhar essa possibilidade de as pessoas poderem meditar com o nosso álbum, usarem-no funcionalmente”, referiu.
A ideia dos músicos é “em cima das bases, tanto do Volume 1 como do 2, pegar nesses áudios e transformá-los em grandes ‘loops’, que é uma continuidade”. “Talvez o Volume 3 seja esse”, disse Paulo Novaes.
Enquanto tal não acontece, os dois têm já marcados concertos de apresentação de “Protocolar, Volume 2”, em Portugal, em janeiro, e no Brasil, em março.
Em 12 de janeiro atuam em Coimbra, no Salão Brazil, no dia 13 em Torres Vedras, no Teatro-Cine, no dia 16 no Porto, na Sala 2 da Casa da Música, e no dia 25 em Lisboa, no B.Leza.
Para 1 de março está já agendado um concerto em São Paulo, na Bona Casa de Música.
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