Em declarações à Agência Lusa, o percussionista Carlos Mil-Homens, um dos elementos do ensemble disse que o alinhamento “foi sendo escolhido ao longo do tempo”, optando pelos “fados que mais diziam” ao grupo e “por poetas mais antigos”.

O álbum inclui as melodias tradicionais dos fados Cravo, Senhora de Monte, Odeón e Versículo, de Alfredo Marceneiro, Súplica, de Armando Machado, o Fado Menor, e poemas de João Dias, Armando Vieira Pinto, Gabriel de Oliveira e Vasco de Lima Couto, entre outros.

O Bela Ensemble é constituído pelos músicos Carlos Mil-Homens (percussão), João Penedo (contrabaixo), Otto Pereira (violino), Ana Margarida (voz) e Rafael Brides (guitarra de sete cordas).

À Lusa, Mil-Homens afirmou que esta 'geometria musical' “aconteceu” e realçou que “mais do que os instrumentos propriamente ditos, o importante são estes músicos” e como se apoiam e interagem.

Mil-homens realçou a presença do violino, o seu “instrumento fetiche" e que “faz as vezes da guitarra portuguesa no fado”, mas “mais do que isso, é o fantástico músico que o toca”, Otto Pereira, nascido em 1983, em Sófia.

A participação do violino, foi uma ideia de Carlos Mil-Homens, e visa “suprir a não presença de um dos instrumentos mais óbvios no fado que é a guitarra portuguesa, o violino é um instrumento que complementa bem o papel da guitarra portuguesa, podem fazer o papel de acompanhante, tem sustentabilidade de notas que lhe permite fazer uma certa aproximação à voz, extraordinariamente bom para ser solista, e sustentação de notas para nos ajudar nas partes de mais melodia”, argumentou.

“Os Bela Ensemble surgiram em Alfama há uns seis, sete anos, no meio daquela boémia toda em que não se ouvia só fado como outras coisas dos músicos que compõem a noite e a cultura lisboetas, e surgiu esta ideia de ter como base o fado, mas tentar por dentro do fado outros universos que compõem esta cidade e, sobretudo, o universo dos diversos elementos que compõem a banda”.

Os fados tradicionais são aqueles de que os músicos mais gostam, disse Mil-Homens, referindo a preferência pelos “poetas mais antigos”, mas incluindo alguns contemporâneos como Maria Margarida Castro, que assina “Ausência”, interpretada no tradicional Fado Pedro Rodrigues, com que abre o álbum, e Carlos Mil-Homens é o autor de “Solene”, interpretado no Fado Versículo, que fecha o alinhamento.

Carlos Mil-Homens reconheceu que perpassa no projeto uma crítica social e irreverência, afirmando que corresponde “à forma de estarem na vida”. "Faz parte do nosso ADN", declarou.

“A nossa música tem um bocadinho essa componente também, não uma intervenção político-social, mas a nossa abordagem ao fado, com esta fusão, é um pouco de irreverência”.

“Não é um cavalo de batalha que temos, mas existe uma inquietude na forma como nós vemos a música, e mesmo que não esteja consciente, a forma de estarmos na vida, as nossas ideias, os nossos ideais, no que acreditamos e não acreditamos, acaba sempre por transparecer naquilo que criamos”, salientou.

“Neste disco está a nossa verdade, não estamos aqui a querer facilitar, a tentar fazer músicas bonitas que sejam fáceis de ouvir e ter uma boa receção comercial”, enfatizou.

Um dos temas, “Eu Sou Povo e Canto Esperança” (Irmãos 1), do poeta João Dias na música do Fado Menor, é uma recuperação do repertório da fadista Julieta Reis, que surgiu no contexto pós-revolucionário do 25 de Abril de 1974, “mas que fazia todo o sentido incorporar neste alinhamento”, à luz atual, defendeu.

Do alinhamento do álbum fazem parte, entre outros temas, “Luas Brancas” (João Monges/Fado Magala, de Raul Portela), “Maldição” (Armando Vieira Pinto/Fado Cravo de Alfredo Marceneiro), “Bêbado Pintor” (João Linhares Barbosa/Fado Laranjeiras, de Marceneiro), “Enigma” (Domingos Gonçalves da Costa/Fado Zé Negro, de Francisco José Marques), e “Eu Preciso de Ouvir a Tua Voz” (Vasco de Lima Couto/Fado Súplica, de Armando Machado), entre outros.

Sobre a escolha dos temas, Mil-Homens asseverou: “Estas músicas foram muito, muito pensadas; existe muito tempo e muito pensamento, e muito ensaio, tentativa, erro até chegarmos ao produto final”.

A partir do próximo dia 8 até dia 15, o Bela Ensemble apresenta o seu álbum de estreia no Quartel das Artes, à Estefânia, em Lisboa.