“No fundo, é como se este festival fosse uma celebração da diversidade e do ecletismo da música portuguesa. Combinamos música contemporânea com cantautores, com propostas multimédia e, no fundo, o que eu quero, como programador, é que este festival seja uma montra de visões muito particulares e muito especiais de artistas nos seus diferentes estilos”, adiantou, em declarações à agência Lusa, o compositor Vasco Mendonça, responsável pela programação.
O festival, organizado pela Associação Francisco de Lacerda – a Música e o Mundo, passa por sítios tão distintos como o Panteão Nacional, em Lisboa, ou as ruínas da casa do compositor açoriano, na ilha de São Jorge.
Os públicos são “muito diferentes” e, “lentamente, mas de uma forma segura”, a organização acredita que os encontros têm vindo a implantar-se na agenda anual dos lugares.
“As pessoas fazem quase três quartos de hora a pé para irem ao concerto da Fajã da Fragueira [São Jorge], verem um concerto ao ar livre, em condições absolutamente naturais. É um concerto essencialmente para a comunidade local e temos vindo a ter uma receção fantástica”, revelou o programador.
Ainda nos Açores, mas na ilha de São Miguel, o espetáculo é dirigido a um público diferente.
“E depois temos, por exemplo, o concerto no centro Arquipélago, em que é um público mais jovem, mais urbano, mais interessado em artes plásticas, em arte contemporânea. Esse também tem respondido muito bem”, avançou Vasco Mendonça.
O festival parte do legado de Francisco de Lacerda (1869-1934), “um compositor absolutamente fundamental da história da música portuguesa”, com “uma carreira internacional única”, mas que “ainda não tem a divulgação que devia ter”, afirma Vasco Mendonça, numa alusão ao percurso internacional do compositor e regente, que dirigiu as grandes orquestras da época, em França e na Suíça, lecionou em Paris e dirigiu os concertos La Baule, os Grandes Concertos de Marselha e a Academia dos Concertos de Nantes.
“Ele tem uma ligação muito forte à sua terra de origem, aos Açores, mas depois tem uma componente cosmopolita. E, num certo sentido, é assim que eu também vejo o que a música portuguesa pode ser. Podemos partir do nosso território, celebrar o que temos de maravilhoso, mas devemos ter ambição para combinarmos esta dimensão local com uma dimensão cosmopolita", salientou o programador.
Os Encontros Sonoros Atlânticos arrancam no dia 14 de setembro no Panteão Nacional, em Lisboa, com um concerto da soprano portuguesa Camila Mandillo, acompanhada pelo quarteto de violoncelos Chiado.
“É uma espécie de celebração de Camões, em que temos vários compositores que escreveram música a partir de Camões, desde Croner Vasconcelos, na primeira metade do século XX, até Amélia Muge”, explicou Vasco Mendonça.
O festival segue para a ilha de São Jorge, no dia 17, estando previsto, pela primeira vez, um ‘workshop’ para bandas filarmónicas locais, que pretende “aprofundar a ligação à comunidade artística local”.
No dia 18, há um concerto nas ruínas da casa onde viveu Francisco de Lacerda, “um local muito especial ao pé do mar, na Fajã da Fragueira”, onde Pedro Branco e João Neves apresentam música de cantautores portugueses.
Os Encontros rumam à ilha Terceira, no dia 20, para um concerto do Maat Saxophone Quartet, um grupo português baseado em Amesterdão, “que vai estrear uma peça encomendada pelo festival à compositora Fátima Fonte”, no Monte Brasil.
A rubrica “Carta Branca”, criada há dois anos, para “propostas mais invulgares e arrojadas, com uma componente multimédia”, leva ao Arquipélago Centro de Artes Contemporâneas, na ilha de São Miguel, Nuno Costa e Óscar Graça, que vão criar uma banda sonora especial para o filme “Flores”, de Jorge Jácome.
O festival encerra, no dia 28, com a Orquestra Metropolitana de Lisboa, na Biblioteca Nacional de Portugal, com a estreia da peça vencedora do Prémio de Composição Francisco Lacerda.
Aberto não só a compositores jovens, mas de todas as idades, o prémio, financiado pela Fundação Millennium BCP, atribui um valor de 7.500 euros ao vencedor e é, segundo Vasco Mendonça, “fundamental para estimular a criação nacional”.
“É um dos prémios mais elevados em valor a nível europeu. Conseguimos fazer um prémio com condições muito especiais, temos um júri internacional, temos um prémio forte pecuniário e temos a estreia por uma orquestra profissional da peça”, frisou.
O compositor defendeu que “ser um criador de música em Portugal é uma tarefa árdua”, alegando que o país ainda tem “uma dotação para a Cultura absolutamente insignificante, comparada com outros países”.
“A criação nacional está de ótima saúde, se falarmos do talento que temos, da criatividade e da qualidade das pessoas a compor e escrever música em Portugal. Está bastante mal, se pensarmos no tipo de apoio e estruturas que temos para manter esse talento e para potenciar esse talento”, alertou.
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