O cancelamento da actuação dos Arcade Fire no Pavilhão Atlântico, prevista para 18 de Novembro, deixou um sabor amargo em grande parte de uma imensa minoria. Mas se os autores de "Funeral" não deverão voltar a estas paragens tão cedo, pelo menos algum do seu público terá feito as pazes com o indie rock canadiano na noite de ontem. O perdão chegou através de "Forgiveness Rock Record", o quarto álbum dos Broken Social Scene, que embora esteja uns furos abaixo de "The Suburbs" não impede que este colectivo também seja, para muitos, nada menos do que uma lenda viva.
O supergrupo, que nos discos chega a contar com mais de trinta músicos convidados - entre os quais Leslie Feist, Emily Haines (dos Metric) ou membros dos Stars - também surgiu ontem em peso, com nove elementos que se ocuparam de vários instrumentos. Essa diversidade marca também as canções, que ontem viajaram entre tons grandiosos e espaciais, momentos mais agrestes e urgentes, com guitarras em disputas vertiginosas, ou instantes mais introspectivos e atmosféricos, onde o vendaval cedeu espaço a pequenos sopros.
Tanta versatilidade é louvável, mas tal como nos discos - em especial no último - nem sempre se desenvolveu de forma especialmente estimulante. Por cada canção como a cativante e melódica "7/4 Shoreline" ou a frágil e belíssima "Guilty Cubicles" surgiu outra que, não comprometendo, também nunca foi muito além da mediania.
O público, contudo, não esmoreceu, mérito de uma banda em forma e visivelmente empenhada em presentar os espectadores com o maior número de canções possível. Resultado: mais de duas dezenas, intercaladas pelos afáveis comentários de Kevin Drew. O mentor do projecto e vocalista principal revelou, entre outras coisas, que não gosta de encores - preenchendo assim esse habitual compasso de espera com mais canções - e assinalou que os Broken Social Scene deram os primeiros passos no bairro português de Toronto.
Além de Drew, também Lisa Lobsinger deu voz às canções da noite, geralmente às de ambientes mais apaziguados. Foi o caso da espiral em aceleração de "Anthems for a Seventeen Year Old Girl" ou da mais etérea "All in All", esta um dos pontos altos de "Forgiveness Rock Record". Noutros momentos, a vocalista partilhou o protagonismo com Drew - um casamento particularmente feliz em "Hotel", de compasso mais jazzy e insinuante, e também dos temas mais aplaudidos. Os restantes elementos da banda não foram menos agraciados, já que ao longo de mais de duas horas todos tiveram a sua oportunidade de brilhar: tanto na guitarra (aliás, numa mão cheia delas) como no baixo, nos teclados ou nos sopros (as cerejas em cima do bolo), num democrático caleidoscópio à canadiana.
Na primeira parte, os Hipnótica levaram a palco o seu novo disco, "Twelve-Wired Bird of Paradise", editado há duas semanas, e nem eles nem o público terão dado o tempo por perdido. Mais acústicos do que nos álbuns anteriores, alicerçados em referências do rock alternativo e não tanto na vanguarda electrónica de outros tempos, não se mostraram por isso menos dinâmicos. O final, com palmas de grande parte dos espectadores a acompanhar, foi um bom aquecimento para o que se seguiu. E nem sequer faltaram elogios dos Broken Social Scene, que pediram aplausos à banda portuguesa já no seu concerto. Esta noite na Casa da Música, no Porto, é muito provável que este exemplo de humildade se repita.
Texto @Gonçalo Sá/ Fotos @Graziela Costa
Videoclip de "7/4 Shoreline":
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