Com a lista de dez finalistas, onde figurou “Tio Tomás, a Contabilidade dos Dias”, da realizadora portuguesa Regina Pessoa, a categoria de Melhor Curta-Metragem de Animação já demonstrava uma nova atitude nos seus critérios de escolha: um conjunto mais diversificado de estilos, com mais atenção à produção europeia e canadiana e ao potencial artístico da animação.

Tio Tomás, a Contabilidade dos Dias

A selecção dos cinco finalistas refinou-se como uma das mais ecléticas da última década. Encontramos produções independentes como “Memorable”, de Bruno Collet; resultados de projetos estudantis, como “Sister”, de Siqui Song, e “Dcera”, de Daria Kashceeva; e ambições comerciais movimentadas por grandes potências da indústria, como “Hair Love”, de Matthew A. Cherry, que após uma campanha no Kickstarter, foi adquirida pela Sony Pictures Animations, e “Kitbull”, de Rosanna Sullivan, que faz parte do programa de aquisição de talentos Sparkshorts, propriedade da Pixar.

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Família, memória e diálogo são temas transversais em todas as narrativas, complementando-se entre si e abrindo espaço a justaposições quando visionadas de seguida. Curiosamente, com estes motivos comuns que povoam histórias de personagens que buscam a comunicação e pertença, quase todos os realizadores optaram por longas sequências de silêncio, deixando aos comportamentos, gestos e olhares, o ónus da expressividade.

E que melhor forma de o fazer, senão com um retorno às raízes das construções “imperfeitas” repletas de traços emotivos e orgânicos?

A Academia achou o mesmo, e ignorando totalmente as produções de excelente qualidade que recorreram à animação CG (como "Hors de Piste"), valorizou a animação 2D e a técnica de "stop-motion", onde vivem personagens feitas em papier mâché, feltro ou barro.

Algumas divertidas, outras profundas, as cinco curtas que estão nomeadas têm o seu estilo plástico escolhido com aprumo, procurando elevar o conteúdo para nos sensibilizar com a graça da imaginação dos seus autores. O resultado em algumas é medíocre, noutras excepcional.

Sister (realização: Siqi Song, China/EUA)

A obra de Siqi foi claramente seleccionada pelo tema e não pelo conjunto de atributos final. Poderia ser a preterida para dar lugar às ausentes "Hors de Piste" ou à curta de Regina Pessoa. Projecto iniciado na escola de animação Calarts, "Sister" assenta na política “uma criança” que ocorria na China durante a década de 1990, para narrar a memória de um homem sobre a infância passada com a sua irmã chata. Com recurso a fantoches criados em feltro, de estética delicada, a curta demonstra vulnerabilidade e, com elementos surreais, alerta-nos para a metáfora. Vai-nos enganando com o seu contexto limitado, até nos apresentar a sua verdade deprimente.

Dcera (real. Daria Kashcheeva, República Checa)

A estudante Daria Kashcheeva abordou o processo de escrita e realização de “Dcera” como uma sessão de psicoterapia, explorando memórias de infância e a influência destas no nosso comportamento. Sem diálogos, por vezes de ritmo demasiado lento, a curta mergulha num episódio fraturante de distanciamento entre um pai moribundo e a sua filha. Com personagens criadas em papier mâché e uma estética influenciada pelos filmes do estilo Dogma, tem na movimentação da câmara um regalo visual.

Hair Love (real. Matthew A. Cherry, EUA)

Carinhosa e imaginativa, "Hair Love" é, para muitos, a candidata mais forte à estatueta. Centrada numa família afro-americana, conta a luta (literalmente num ringue de boxe) de um pai com o cabelo da sua filha, quando a penteia pela primeira vez. Com um design de som mediano, escondido por uma música demasiado presente, animação 2D comercial, executada com personalidade nas suas personagens e exagero de movimentos, tem o seu trunfo na moral da narrativa. Esta curta da Sony é uma obra simples, coesa e universal, que valoriza aqueles pequenos detalhes da nossa vida que trazem consigo uma importância inesperada.

"Hair Love" é uma das curtas que está disponível para visionamento.

Kitbull (real. Rosana Sullivan, EUA)

Efetuando um comentário social sobre violência aos animais, Rosana Sullivan explora sentimentos de isolamento, confiança e empatia na dor, através da amizade improvável entre um gato maltrapilho e um pitbull maltratado. Recorrendo à imprevisibilidade da animação tradicional, esta curta dos estúdios Pixar imprime nos movimentos dos animais uma grande energia, enquanto compõe uma história triste, doce e amorosa, que acabará em alegria e fraternidade.

"Kitbull" é uma das curtas que está disponível para visionamento.

Mémorable (real. Bruno Collet, França)

Bruno Collet conta-nos a história de um pintor que já não consegue reconhecer o rosto da sua esposa. Influenciado pela obra do pintor William Utermohlen, que desenhou auto-retratos enquanto doente de Alzheimer, Collet veicula a psicologia da personagem através de abstração visual, ilustrando os momentos de desorientação e de busca de apego. De uma forma que só a animação pode criar e contemplar, parece querer dar-nos resposta e sentido para aquele olhar perdido do nosso familiar ou amigo que foi vencido pela doença. Dolorosa, é a curta que gostaríamos de ver com a estatueta de Melhor Curta de Animação nas mãos na noite de 9 de fevereiro.

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