E se o melhor ator for uma mulher, ou a melhor atriz, um homem? O Festival de Cinema de Berlim quis dar um passo em nome da igualdade e premiará uma atuação "sem género".
A Berlinale entrega os seus cobiçados prémios Ursos na sexta-feira (5). Antes, o júri premiava o melhor ator e a melhor atriz com o Urso de Prata.
Mas para este ano, o festival decidiu ser pioneiro na luta contra a discriminação e os estereótipos de género, tema atual no mundo do cinema depois do escândalo #MeToo.
"Pela primeira vez, os prémios serão definidos de uma forma neutra em termos de género", com um simples "Urso de Prata para Melhor Atuação" e um "Urso de Prata para Melhor Secundário", anunciaram os organizadores.
No cinema, o único prémio que "distingue os sexos [era] o de atuação", disse à AFP Mariette Rissenbeek, codiretora da Berlinale.
"Acreditamos que podemos avançar nas discussões sobre igualdade [...] e também levamos em conta as pessoas que não querem ser designadas por nenhum género", acrescentou.
"Ato político"
A decisão foi aplaudida por vários realizadores e intérpretes do concurso.
Para a cineasta libanesa Joana Hadjithomas, “é um ato simbólico forte dizer: 'um ator é um ator', não é o seu género que determina" o seu valor.
O japonês Ryūsuke Hamaguchi destacou que este novo prémio "reflete a essência do cinema", que, como arte, não distingue "com base no género".
“Isso também abre as portas para um debate mais amplo, especialmente a questão de quem deveria interpretar os papéis de lésbicas, gays, etc.”, disse a atriz alemã Maren Eggert.
A decisão de meados de 2020 foi comentada por personalidades do cinema que se destacaram na luta pela igualdade de género, como a britânica Tilda Swinton e a atriz australiana Cate Blanchett, entrevistada pela agência France Press (AFP) no Festival de Cinema de Veneza.
"Uma boa atuação é uma boa atuação, seja qual for a orientação sexual ou da pessoa que a realiza”, resumiram.
A decisão da Berlinale, por enquanto, não influenciou os grandes festivais.
"Boas intenções"
"Existem opiniões diferentes sobre os prémios 'sem género' e respeitamos diferentes pontos de vista", enfatizou Rissenbeek.
Em termos de igualdade entre homens e mulheres, alguns até temem que a decisão pode premiar mais homens.
O caminho para "o inferno é pavimentado com boas intenções", advertiu a historiadora da Sétima Arte, Geneviève Scellier.
"O problema subjacente é que os papéis masculinos são mais interessantes", mais numerosos e mais presentes na ecrã "do que os femininos", destacou.
O prémio sem género no festivalde Berlim deve-se mais à ideia de fazer algo “politicamente correto”, considerou o sindicato de atores e atrizes alemães, que defende que, antes de tudo, “as mulheres sejam mais visíveis”.
Esta também foi a opinião da associação alemã Pro Quote, que milita para que a distribuição dos papéis no cinema seja equitativa, já que, segundo ela, 70% dos papéis são masculinos.
"Em primeiro lugar, devemos defender a visibilidade das mulheres no cinema e alcançar a igualdade", disse à AFP uma das pessoas da associação, a agente Chun Mei Tan.
"Só então podemos falar sobre a introdução de prémios sem género", concluiu.
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