A gigantesca indústria cinematográfica da Índia é conhecida pelas suas histórias masculinas e focadas no homem. Mas uma vaga de cineastas está a romper padrões em Bollywood.

"Cada vez mais mulheres estão a escrever as suas histórias e a transformá-las em filmes", comemora a argumentista e realizadora Reema Kagti.

Esta tendência traz uma "perspetiva mais real e saudável" aos filmes, com personagens femininas complexas e protagonistas das suas próprias histórias, diz.

A nação mais populosa do mundo produz entre 1.800 e 2.000 filmes por ano em mais de 20 idiomas diferentes. Bollywood, a indústria de idioma hindu, é um dos seus segmentos mais importantes, com mais de 300 produções.

No entanto, estes filmes raramente conseguiam retratar as mulheres de forma autêntica e normnalmente colocavam-nas em papéis de donas de casa passivas ou mães que cedem à pressão social.

Um estudo de 2023 do Instituto Tata de Ciências Sociais (TISS) revelou que as personagens femininas nos filmes de maior bilheteira da Índia desempenham papéis românticos e têm "pele clara, corpo esguio e pouco tempo em cena".

Mas especialistas da indústria apontam que vários filmes dirigidos por mulheres receberam reconhecimento internacional e também tiveram bom desempenho nas bilheteiras indianas.

Os atores Chhaya Kadam, Kani Kusruti, a realizadora Payal Kapadia, Divya Prabha e Hridhu Haroon no Festival de Cannes para a antestreia de "All We Imagine as Light" a 23 de maio de 2024

O filme "All We Imagine as Light – Tudo o Que Imaginamos Como Luz", um conto poético de duas enfermeiras que iniciam uma amizade intergeracional, foi a primeira produção indiana a ganhar o Grande Prémio do Júri no Festival de Cannes do ano passado.

A realizadora Payal Kapadia disse que queria romper com o retrato unidimensional das mulheres indianas, que muitas vezes reflete "padrões irreais estabelecidos pela sociedade", em favor de um que permitisse que as mulheres "fossem elas mesmas, autênticas e fiéis a quem são nas suas vidas quotidianas".

O mais recente candidato indiano a uma nomeação ao Óscar de Melhor Filme Internacional também encaixava nessa tendência: "Lost Ladies", comédia da realizadora Kiran Rao, desafiava ideias preconcebidas sobre casamento e feminilidade.

"Ainda misóginos"

Konkona Sen Sharma, atriz, realizadora e figura de destaque no cinema voltado para mulheres, expressa um otimismo cauteloso, já que ainda "não há mulheres suficientes em posições de poder".

Lakshmi Lingam, socióloga de Bombaim, nota que os filmes de maior sucesso comercial "ainda são muito voltados para o público masculino", com enredos "ainda misóginos".

"Algumas argumentistas têm ótimas ideias, mas os produtores não querem apoiar essas histórias", diz.

"Eles intervêm e fazem tantas mudanças que transformam a protagonista feminina num homem, criando uma 'personagem maior que a vida'. No fim das contas, o dinheiro determina o que pode ou não ser feito", lamenta.