James Caan, estrela de "O Padrinho" e outros filmes ao longo de mais de cinco décadas, morreu esta quarta-feira à noite, aos 82 anos.
"É com grande tristeza que vos informamos do falecimento do Jimmy na noite de 6 de julho. A família agradece as demonstrações de amor e as sinceras condolências e pede que continuem a respeitar a sua privacidade durante este período difícil. Fim do tweet", informou laconicamente a conta oficial do ator nas redes sociais esta quinta-feira.
Filho de imigrantes judeus da Alemanha que se estabeleceram primeiro na Bronx e a seguir em Queens, James Edmund Caan (Nova Iorque, 26 de Março de 1940) ficou imortalizado pelo papel de Santino "Sonny" Corleone, o filho mais velho de Vito Corleone, cujo temperamento intempestivo define o rumo da família e cria algumas das cenas mais memoráveis no clássico de Francis Ford Coppola "O Padrinho" (1972), que ganhou três Óscares, incluindo o de Melhor Filme.
No caso de Caan, também foi a sua única nomeação para as estatuetas, na categoria de Ator Secundário, e mesmo sem ganhar estava lançada uma carreira de "duro" do cinema americano e ícone da masculinidade, onde se destacam vários filmes marcantes durante o resto da década.
Ao Deadline, o realizador recordou que "o Jimmy foi alguém que se estendeu pela minha vida por mais tempo e mais próximo do que qualquer figura de cinema que alguma vez conheci. Desde os primeiros tempos a trabalhar em 'Chove no Meu Coração', ao longo de todos os marcos da minha vida. Os seus filmes e os muitos grandes papéis que desempenhou nunca serão esquecidos. Velho amigo de Sunnyside, colaborador e uma das pessoas mais engraçadas que alguma vez conheci".
JAMES CAAN A 22 DE FEVEREIRO, NA CELEBRAÇÃO DOS 50 ANOS DE "O PADRINHO" NOS ESTÚDIOS PARAMOUNT
"Jimmy foi o meu irmão na ficção e meu amigo para toda a vida. É difícil acreditar que ele não vai estar mais no mundo porque ele era tão vivo e ousado. Um grande ator, um realizador brilhante e meu querido amigo. Vou sentir a sua falta", disse Al Pacino em comunicado ainda ao Deadline, enquanto Robert De Niro foi mais sucinto com "Estou muito, muito triste por saber do desaparecimento do Jimmy".
"O seu grande talento sempre será amado e lembrado", disse também à AFP a atriz Talia Shire, que interpretou Connie, irmã mais jovem de Sonny Corleone.
Numa conferência de imprensa em 2010, Caan disse que nunca se cansou de falar sobre o clássico da máfia, que completou 50 anos este ano.
"Foi uma benção (...) Não sabia que fariam uma segunda parte, se soubesse teria-me recusado a morrer", brincou na época, referindo-se ao trágico desfecho de Sonny no primeiro filme.
"Ao contrário de atores que se escondem ou não querem dar autógrafos ou ser reconhecidos, estou muito agradecido que as pessoas ainda se lembrem de que estou vivo e o resto", destacava.
Apesar do impacto de Sonny Corleone, o grande papel de Caan no cinema está provavelmente em "O Ladrão Profissional" (1981), o primeiro filme de Michael Mann, como Frank, um duro e desenrascado ladrão, preso entre as famílias do crime organizado de Chicago e os polícias corruptos, a tentar largar a vida do crime, que aceitava um "último trabalho" onde nada iria correr como planeado.
O realizador escreveu nas redes sociais: "Que perda terrível e trágica. O Jimmy não era apenas um grande ator com total comprometimento e espírito aventureiro, mas tinha uma vitalidade no âmago do seu ser que impulsionava tudo, desde a sua arte e amizade até ao desporto e diversão. Havia um núcleo de valores dentro dele sobre como as pessoas deveriam ser, mais ou menos. Podia ser variável, os cantos podiam ser arredondados com ironia urbana, mas havia uma linha e não era fungível. E produziu muitas anedotas ultrajantes e hilariantes. Adorava-o e adorei trabalhar com ele. Alcançou o âmago do seu ser durante momentos pessoais difíceis para ser Frank, a criança meio rebelde e selvagem, o 'outsider' institucionalizado, no meu primeiro filme. Frank é metade Frank, metade Jimmy. A personagem e o homem - como o seu Sonny em 'O Padrinho' - foram feitos um para o outro. Único. Que perda".
Praticante de boxe, basquetebol, "rodeo" e Futebol Americano, o que lhe viria a ser bastante útil nos muitos papéis atléticos em filmes de ação na primeira fase da carreira, Caan gostava de dizer que se salvou de uma vida de marginalidade graças à representação, começando pelo teatro e a seguir pela participação em várias séries de TV, antes de fazer a estreia não creditada no cinema em "Irma la Douce" (1963).
A seguir, fez-se logo notar em "Os Bárbaros do Século XX" (1964), "Assim Morrem os Bravos" (1965) e "El Dorado" (1967), antes de se dar o encontro decisivo com Coppola em "Chove no Meu Coração" (1969), onde contracenou pela primeira vez com Robert Duvall, que conhecera alguns anos antes no reputado conservatório Neighborhood Playhouse School of the Theatre, de Nova Iorque, e se tornou um amigo para toda a vida.
Em 1971, interpretou o jogador de Futebol Americano com cancro terminal Brian Piccolo em "Brian's Song ("Estranhos Companheiros") ao lado de Billy Dee Williams (o futuro Lando Calrissian), um sucesso gigantesco de audiências (30 milhões de espectadores) que permanece um dos telefilmes mais marcantes da história da televisão americana e lhe valeu a nomeação para os prémios Emmy.
Tal como os seus colegas, Caan tornou-se uma estrela de cinema com "O Padrinho": entre os melhores filmes nos anos seguintes estão "O Passe da Meia-Noite" (1973), "O Vício do Jogo" (1974), "Funny Lady" (1975), "Rollerball - Os Gladiadores do Século XXI" (1975), "Assassinos de Elite", embora ele o tenha detestado (1976), além do regresso para uma cena de flashback em "O Padrinho - Parte II" (1974) e um pequeno papel como "James Caan" em "A Última Loucura de Mel Brooks" (1976) antes de se juntar ao gigantesco elenco de "Uma Ponte Longe Demais" (1977).
Ansiando uma mudança de registo, partiu para França para fazer "Outro homem para uma mulher" (1977) às ordens de Claude Lelouch, que consideraria um dos seus melhores filmes, antes de regressar aos EUA para "Uma Mulher Implacável" (1978), ao lado de Jane Fonda, e "Capítulo Segundo" (1979), que foram sucessos de bilheteira.
Sinal da sua popularidade também é a lista de projetos que rejeitou ao longo da década de 1970, incluindo alegadamente "Love Story", "M*A*S*H", "Os Incorruptíveis Contra a Droga", "Voando Sobre um Ninho de Cucos", "Encontros Imediatos do Terceiro Grau", "Super-Homem", "Kramer Contra Kramer", "Apocalypse Now" e, mais tarde, "Blade Runner".
Em 1980, fez "Separação", a sua única experiência como ator e realizador, antes de reencontrar Lelouch em "Uns e... os Outros" (1980), um grande sucesso comercial em França, e "O Ladrão Profissional" (1981), que apesar de ter sido um fracasso de bilheteira, se tornou um filme de culto.
A má experiência na rodagem de "Beija-me e Adeus" (1982), o esgotamento com Hollywood e uma crescente dependência da cocaína após a morte por leucemia da irmã, levaram à depressão e a um afastamento entre 1982 e 1987, que efetivamente colocou fim à sua carreira enquanto estrela de primeiro plano em Hollywood.
Seria Coppola que o traria de volta para um marcante papel dramático em "Jardins de Pedra" (1987), mas "Os Novos Invasores" (1988), onde interpretava um polícia que tinha como parceiro um extra-terrestre, foi o sucesso que o trouxe de volta a Hollywood, em parte ajudado por velhos amigos que o queriam voltar a ver a trabalhar: após um pequeno papel debaixo de muita caracterização em "Dick Tracy", de Warren Beatty (1990), esteve a grande nível como o escritor atormentado pela sua enfermeira em "Misery - O Capítulo Final" (1990), de Rob Reiner, que valeu o Óscar de Melhor Atriz a Kathy Bates", e "Dias de Glória... Dias de Amor" (1991), ao lado de Bette Midler.
"Fiquei muito triste ao saber que Jimmy nos deixou. Adorei trabalhar com ele. Era um ator talentoso e instintivo", reagiu Reiner.
Ao longo dos anos 1990, andou por filmes como "Lua-de-Mel em Las Vegas" (1992), "Unha com Carne" (1993) e "A Boy Called Hate" (1995), onde contracenou com o filho Scott Caan (futuro ator da série "Hawai Força Especial"). Encontrou Arnold Schwarzenegger em "Eraser" (1996), Luke Wilson e Owen Wilson em "Roda Livre" (1996), o filme de estreia de Wes Anderson, Adam Sandler e Damon Wayans em "À Prova de Bala" (1996), e Hugh Grant em "Mickey Blue Eyes" (1999), onde brincou com a sua imagem de mafioso.
Apesar de se lhe ter colado à pele a imagem de virilidade e ação, e dos projetos comerciais, fazendo com que não fosse colocado ao mesmo nível dos outros atores de "O Padrinho", Caan claramente sabia escolher projetos e realizadores que se tornaram conhecidos mais tarde: continuámos a vê-lo em bom plano por exemplo em "Nas Teias da Corrupção", de James Gray (2000), "A Lei das Armas", de Christopher McQuarrie (2000), "Dogville", de Lars von Trier (2003), e "Elf - O Falso Duende", de Jon Favreau (2003).
Pela mesma altura, também teve a humildade de se sujeitar a uma audição e ganhou o papel de Ed Deline em "Las Vegas", uma série que se tornou bastante popular e onde permaneceu quatro temporadas (2003-2007) antes de decidir regressar ao cinema, nomeadamente em "New York, I Love You" (2008), "Get Smart - Olho Vivo" (2008), "O Substituto" (2011), "Pai Infernal", um dos piores filmes de Adam Sandler (2013), ou como uma das vozes das animações "Chovem Almôndegas" (2009-2013).
Ainda assim, os melhores filmes desta fase foram "Laços de Sangue", de Guillaume Canet (2013), e "Lugares Sagrados", de Amanda Sthers (2017), estando por estrear "Fast Charlie", de Phillip Noyce, onde teve como colegas Morena Baccarin e Pierce Brosnan.
Caan foi casado quatro vezes e teve cinco filhos. Por vezes, a vida pessoal parecia misturar-se com alguns de seus papéis mais famosos: em 1992, testemunhou no julgamento de Ronald Lorenzo, um conhecido membro da família criminosa Bonanno, ativa em Nova Iorque, que mais tarde foi condenado por tráfico de drogas e sentenciado a 11 anos de prisão, dizendo que era o seu melhor amigo.
Em 1994, ele foi preso por puxar de uma arma semiautomática no meio de uma discussão sobre um carro que fora vandalizado.
"James Caan. Adorava-o tanto. Sempre quis sempre como ele. Tão feliz por o ter conseguido conhecer. Nunca parava de rir quando estava à volta deste homem. Os seus filmes eram os melhores dos melhores. Iremos todos sentir terrivelmente a sua falta", escreveu Adam Sandler ao saber da morte.
Comentários