O público de Bruxelas rendeu-se na quinta à noite ao filme “A Fábrica de Nada”, resistindo à surpresa inicial de estar perante uma película de três horas de duração para aplaudir a obra na presença do seu realizador, Pedro Pinho.

A meia hora do início do arranque da programação dedicada a revelar a obra de Pedro Pinho e da Terratreme, já o bar ‘underground’ do cinema Nova, que serve de montra para a exposição de fotografias dos filmes da produtora portuguesa, estava lotado de espetadores que aguardavam descontraidamente pelo toque da sineta, o sinal que anunciava a abertura da sala e a contagem decrescente para a projeção.

Entre uma cerveja e outra, a espera fazia-se de diálogos cruzados, de uma banda sonora indistinta de vozes e idiomas. De quando em vez, alguém exclamava: “Três horas? Tanto?”.

No entanto, assim que entraram na sala, parecida com um armazém abandonado, os espetadores, alguns ainda de copo na mão, deixaram-se embalar pela voz de Gwenaël Breës e pela sua apresentação de “A Fábrica de Nada”.

Tal como tinha feito numa entrevista à agência Lusa, o programador do cinema Nova contou o seu processo de descoberta do filme e da produtora Terratreme, apresentou Pedro Pinho, detalhou as sessões nas quais o realizador português estará presente até domingo, pediu desculpa pela “pronúncia” ao elencar os filmes - é, de facto, um português bem distante do original - e arrancou brados com a informação de que o filme iria durar três horas.

“É para resistentes”, avisou o realizador - e foram-no todos, sem que uma única desistência ou um único ecrã de telemóvel iluminado se registassem durante a projeção.

“Estou muito contente por estar aqui a celebrar os dez anos da Terratreme. Queria dizer-vos que este filme foi realizado durante a crise e que foi contaminado pelo sentimento de humilhação e desorientação que sentimos nesse momento”, explicou Pinho antes que as luzes se apagassem para dar início à sessão.

O burburinho desapareceu para que “A Fábrica de Nada” se fizesse ouvir e os espetadores “caíram” num silêncio profundo, só interrompido por muitas e sonoras gargalhadas e pelo expansivo aplauso final.

Terminada a sessão, tempo para uma conversa com o realizador: num francês quase perfeito, Pedro Pinho repassou a aventura que foi “compor” intermitentemente durante quase seis anos o filme que ganhou o Prémio da Crítica em Cannes, mencionou a crise, a ‘troika’, as dúvidas existenciais dos portugueses durante aqueles anos traumáticos, mas também os problemas que sentiu para garantir subvenção para a sua obra e para a distribuir – precisamente pela sua duração.

“Tive reações muito diferentes. A maioria são positivas, as pessoas ficam até ao fim [ri-se]. O filme foi exibido em vários países. Naqueles que foram mais afetados pela crise, as pessoas compreendem muito rapidamente a mensagem, identificam-se. Por exemplo, em Espanha e no Brasil tive conversas muito longas com o público, de mais de uma hora. Infelizmente, ainda não consegui mostrar o filme na Grécia”, revelou.

Gwenaël Breës aproveitou o mote para perguntar pelo Governo da ‘geringonça’, questionando-o se o filme hoje seria igual, com Pinho a apontar a ausência de sentimento de humilhação como a grande diferença para os dias atuais.

“Tudo melhorou ao nível económico, mas o paradigma não mudou porque o nosso destino está dependente das decisões de [Donald] Trump, do Banco Central Europeu. Qualquer coisa nos pode deixar novamente nessa situação”, notou.

TRAILER "A FÁBRICA DE NADA".

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