Arranca esta quarta-feira o Festival de Cannes, Meca da Sétima Arte, com um número redondo, o da 70ª edição, e a apanhar o comboio da modernidade com a realidade virtual, as séries e a Netflix.

"Les Fantômes d’Ismaël", de Arnaud Desplechin, abrirá o certame e as estrelas constantes até ao último dia, 28 de maio, serão o realizador Pedro Almodóvar no júri e a atriz Monica Bellucci como anfitriã.

Os restantes membros do júri, como os atores americanos Will Smith e Jessica Chastain, a atriz francesa Agnès Jaoui e a chinesa Fan BingBing, também já chegaram e estiveram presentes na tradicional ceia da véspera da abertura.

Pela passadeira vermelha vão passar Joaquin Phoenix, Nicole Kidman, Clint Eastwood, Isabelle Huppert, Dustin Hoffman e muitas outras vedetas estão prometidas.

"Nunca tínhamos convidado antes tantas estrelas internacionais", disse o presidente do Festival, Pierre Lescure, que destacou ainda que o evento será "um retiro para falar somente sobre cinema", num momento marcado na França pelas eleições presidenciais, assegurando que as medidas de segurança continuarão a ser importantes num país que ainda aplica o estado de emergência por causa dos recentes atentados.

Ainda assim, existe um colorido político adicional na edição da maior mostra de cinema do mundo, através do tema das mudanças climáticas e do ativismo. E ainda outra crise.

"A questão dos refugiados é fundamental e está presente na escolha" dos filmes, disse o delegado-geral, Thierry Frémaux.

Entre as 19 produções na corrida à Palma de Ouro são aguardadas com muita ansiedade "The Beguiled", de Sofia Coppola, "Wonderstruck", de Todd Haynes, "L'Amant double", de François Ozon, e principalmente "Happy End", de Michael Haneke, que já ganhou por duas vezes em Cannes.

Outros dois filmes merecem atenção especial porque são da gigante do 'streaming' Netflix: "The Meyerovitz Stories", de Noah Baumbach, e "Okja", de Bong Joon-Ho.

A sua presença em competição originou protestos das salas de cinema francesas, que não poderão exibi-los por causa da legislação, a não ser que a plataforma aceitasse adiar o seu lançamento na internet em 36 meses.

Há uma semana, o Festival lamentou que o seu apelo para a Netflix - que tem 100 milhões de assinantes no mundo - cedesse nesta questão tivesse sido recusado e anunciou que, a partir de 2018, todas os filmes em competição deverão "comprometer-se previamente a serem distribuídos nas salas francesas".

Portugal passa ao lado da Palma

Nenhum filme português está na secção principal, mas a presença nacional manifesta-se em dois programas paralelos: na Quinzena de Realizadores estará a longa-metragem "A Fábrica de Nada", de Pedro Pinho, e as curtas-metragens "Farpões Baldios", primeiro filme de Marta Mateus, e "Água Mole", animação de Laura Gonçalves e Xá. Na Semana da Crítica estrear-se-á a curta-metragem "Coelho Mau", de Carlos Conceição.

A presença latina terá um forte representante com o mexicano Alejandro González Iñárritu, que volta à Croisette com uma curta-metragem de realidade virtual, outra novidade tecnológica para o antigo festival, sobre a experiência de ser um migrante: "Carne y arena", apresentado fora da competição, acompanha um grupo de refugiados "vivendo intensamente parte do seu périplo", segundo declarações do cineasta mexicano, citado num comunicado.

Duas séries de televisão também prometem dar que falar, principalmente a terceira temporada de "Twin Peaks", de David Lynch, sucesso dos anos 1990, de que serão exibidos dois episódios.

A outra série é a segunda temporada de "Top of the Lake", da realizadora neozelandesa Jane Campion, com Nicole Kidman, que será exibida numa sessão especial.

A 70ª edição do festival prestará ainda homenagem ao grande cineasta polonês Andrzej Wajda, falecido em outubro de 2016 e distinguido com a Palma de Ouro em 1981 por "O Homem de Ferro", sobre as origens do sindicato Solidariedade. O líder histórico do Solidariedade, Lech Walesa, deverá assistir à sessão.