10 de julho

Para Juho Kuosmanen, é possível encontrar beleza na derrota, na tristeza e na desilusão. Foi sob esta essência que conquistou a secção Un Certain Regard em 2016, com a planeada queda de um promissor pugilista em “O Dia Mais Feliz na Vida de Olli Maki”.

Passados cinco anos, o realizador finlandês regressa à Riviera Francesa e desta vez atravessa a porta grande. Ou seja, entra na Competição Oficial pela Palma de Ouro com “Compartment Nº6” ("Hytti nro 6" no original).

Neste seu novo filme embarcamos numa literal travessia pessoal a bordo de um transiberiano, com uma aspirante a arqueóloga disposta a visitar petróglifos nos confins da Rússia e a lidar com as sucessivas desilusões que, no entanto, irão surgir. Contudo, não se espere nada de melancólico ou soturno: Juho Kuosmanen é fascinado pela aceitação do destino, pela inconformidade e, através disso, aduba as suas personagens, atribuindo-lhes maturidade como uma recompensadora moral, ao mesmo tempo que pontua a narrativa com um inspirador humor nórdico, sarcástico e caótico.

Visto mencionarmos caos, passemos ao outro concorrente do dia na corrida à Palma de Ouro: “La Fracture”, de Catherine Corsini, uma comédia negra cuja ação decorre maioritariamente no interior de um hospital parisiense durante o calor das manifestações dos chamados “coletes amarelos”.

La Fracture

O filme revela-se em joguetes de gags políticos (acrescentando a habitual luta entre classes) e de sátira ao sistema nacional de saúde francês, sempre povoado por personagens neuróticas, inquietas e desesperadas.

Fora o seu lado de exagero cómico ou do tom apocalíptico a que cede no terceiro ato, “La Fracture” tem a possibilidade de se enquadrar perfeitamente na atualidade, da histeria agarrada à pandemia até ao cada vez mais vincado radicalismo.