Kai Bird acabou de voltar do Festival Literário de Jaipur, onde autografou várias cópias do seu livro "Oppenheimer", que inspirou o filme, para jovens indianos que torcem para seja o grande vencedor dos Óscares.

"American Prometheus: The Triumph and Tragedy of J. Robert Oppenheimer" ("Prometeu Americano: O Triunfo e a Tragédia de J. Robert Oppenheimer", em tradução literal), não editado em Portugal, a sua biografia do pai da bomba atómica, vencedora de um Pulitzer, foi o livro utilizado pelo cineasta Christopher Nolan, que arrecadou quase mil milhões de dólares nos cinemas mundiais e dominou a temporada das prémios de Hollywood.

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"É realmente um fenómeno impressionante", disse Bird à France-Presse.

"Devo ser o biógrafo mais sortudo do planeta", acrescentou.

Bird trabalhou com Martin Sherwin, falecido em 2021, na biografia de 720 páginas sobre a vida de J. Robert Oppenheimer, um homem considerado herói americano antes de sofrer uma humilhação pública avassaladora.

O filme de Nolan foi a quarta tentativa de levar a história dramática para o cinema. Outros projetos não conseguiram convencer os executivos dos estúdios de Hollywood, que viam o material como muito difícil, polémico ou complicado, de acordo com Bird.

"Olhando retrospetivamente, estou feliz, porque veio Nolan. E ele fez algo que acredito ser bastante especial", defendeu.

O atual sucesso foi baseado no livro de 2005, chegando a usar linhas de diálogo inteiras.

Bird participou no processo de adaptação. Em 2021, encontrou-se com Nolan para tomar chá em Nova Iorque.

Seis meses antes, o realizador recebera o livro e escreveu um argumento e estava pronto para viajar até à Irlanda para apresentar o projeto ao ator Cillian Murphy. A seguir, Bird visitou o set no Novo México, onde conheceu o protagonista durante as filmagens.

"Cuidado"

Mesmo com três horas de duração, a história no cinema não consegue abranger todas as informações de um trabalho exaustivo que demorou 25 anos de pesquisa e escrita.

Bird e Sherwin abordam a rica infância de Oppenheimer, que morava num luxuoso apartamento decorado com obras de Picasso, Cézanne e Van Gogh, em Nova Iorque.

Com pouco mais de 20 anos, Oppenheimer sofreu várias crises depressivas que levaram a pensamentos suicidas. Passou a maior parte dos seus últimos 12 anos de vida numa casa de praia nas Caraíbas.

Para Bird, entretanto, o filme concentra-se astutamente em vários temas "atuais" que surgem da trajetória trágica de Oppenheimer.

"Até as gerações mais jovens, ao assistirem ao filme, entendem que elas e os seus pais se tornaram demasiado tolerantes a viver com a bomba", explica.

O biógrafo acredita também que a situação polarizada da atual política americana tem as suas raízes nas perseguições macarthistas dos anos 1950 - que acabaram com os alegados simpatizantes do comunismo, incluindo Oppenheimer.

O advogado mentor de Donald Trump, Roy Cohn, era conselheiro-chefe do senador criador do macarthismo, Joseph McCarthy, destacou Bird, dizendo existir "uma ligação entre os dois".

"Em parte, é exatamente o que aconteceu com Oppenheimer em 1954, quando foi humilhado e destruído como um intelectual público porque usava a sua experiência científica para se manifestar", disse Bird.

"Isto envia uma mensagem aos cientistas em todo o lado. 'Cuidado ao sair da vossa limitada área de especialização'", esclarece.

Óscares

No domingo (10), Bird e a sua esposa irão estar presentes na cerimónia dos Óscares em Hollywood. Estarão a torcer para a produção nas suas 13 nomeações, mas principalmente na categoria de Melhor Argumento Adaptado.

Se "Oppenheimer" ganhar o prémio de Melhor Filme, como é esperado, Nolan pode reiterar no seu discurso que, na sua opinião, o físico foi a pessoa mais importante que já existiu.

"Quando ouvi Nolan dizer isso pela primeira vez, pensei 'Bem, é um pouco de promoção para o filme'", sorri Bird.

Mas "Oppenheimer deu-nos a era atómica, simboliza essa era que ainda estamos a viver", diz o autor. "Sempre viveremos com a bomba. Nesse sentido, ele é realmente a pessoa mais importante que já existiu".