O documentário “1965 – Panreal um edifício de Nadir Afonso”, realizado por José Paulo Santos, retrata os três últimos anos de luta pelo imóvel de Vila Real que foi demolido em fevereiro para a renovação de um supermercado.

O cineasta de 41 anos, residente em Vila Real, disse que “1965” representa “uma homenagem” ao arquiteto e artista plástico, no ano em que se comemora o centenário do seu nascimento. Nadir Afonso faleceu em 2013.

“Comecei a fazer este filme quando foi a primeira demolição clandestina da Panreal. Achei que era a altura de começar a atuar, fui-me interessando cada vez mais pelo edifício, fui acompanhando os movimentos de defesa e cada vez fui gostando mais do edifício”, afirmou.

O espaço privado onde estava localizado o imóvel projetado por Nadir Afonso, construído em 1965, foi adquirido pelo Lidl e acabou de ser demolido em fevereiro, no âmbito do projeto de renovação da loja local da cadeia de supermercados.

Em abril de 2017, já tinham sido demolidas partes da fachada da antiga panificadora.

Durante estes três anos, a Associação Alter Ibi foi uma das vozes mais ativas na defesa do edifício da panificadora ou Panreal, como era conhecido pelos habitantes locais.

créditos: Fundação Nadir Afonso

No documentário, José Paulo Santos mostra as manifestações, tertúlias, vigílias e até audiências na Assembleia da República, até ao derrube final do edifício.

Fala também com antigos trabalhadores da panificadora, com vizinhos e acompanha a viúva de Nadir, Laura Afonso, numa visita ao interior do imóvel devoluto.

O filme mostra ainda um casal de Vila Real que fez a festa de casamento naquele espaço, há 36 anos, e que regressa ao edifício com o álbum de fotografias tentando reconhecer os locais do seu interior.

“O meu objetivo foi essencialmente uma questão de memória. Claro que esta memória e estas pessoas que gostam e têm uma ligação ao edifício acabam por criticar quem não protegeu o edifício como deveria ter protegido. Mas, o meu objetivo era a memória essencialmente”, salientou.

Para Laura Afonso, o documentário “é um documento para o futuro”.

“A luta valeu a pena porque, no meio disto tudo, conhecemos pessoas interessantes que se debatem pelo bem de Vila Real, pela defesa do património, dos valores. Foi Vila Real que ficou a perder, ganhou um hipermercado, mas hipermercados há muitos e a panificadora era única”, afirmou a viúva do artista.

Laura Afonso adiantou que está também a ser preparado um livro sobre a panificadora, que deverá ser lançado até ao final do ano.

A Direção-Geral do Património Cultural (DGPC) arquivou em abril de 2018 o procedimento de classificação para Imóvel de Interesse Público, proposto por um grupo de cidadãos, considerando que o edifício já não reunia características para uma classificação de âmbito nacional.

Em 2019, a Câmara de Vila Real decidiu também não classificar a panificadora como imóvel de interesse municipal.

O edifício tem um projeto congénere em Chaves. Os dois imóveis marcam a carreira de Nadir Afonso, por serem os seus últimos projetos de arquitetura.

O filme “1965 – Panreal um edifício de Nadir Afonso” é a primeira longa metragem de José Paulo Santos e, depois da antestreia, na semana passada em Vila Real, vai ser exibido em dezembro, na Universidade de Porto, no âmbito das comemorações do centenário de Nadir Afonso.

Segundo o realizador, o objetivo é levar o documentário a festivais internacionais de cinema.

José Paulo Santos fez os filmes “Observador”, “Circunstâncias” e “… além da sala de espera”, sendo este último um documentário que entre 2015 e 2017 esteve em 13 festivais internacionais, tendo recebido uma menção honrosa no Art Tur (Porto) e um certificado de excelência em Nova Deli (Índia).