Julian Sands falou sobre os perigos e as "coisas assustadoras" que se encontram enquanto se pratica alpinismo numa entrevista dada semanas antes de desaparecer durante essa atividade em janeiro.

Conhecido por filmes como "Quarto Com Vista Sobre A Cidade", "Warlock", "Morrer em Las Vegas" e "Romansanta", o ator britânico com grande experiência de montanhismo a falava sobre um novo trabalho para a BBC quando o tema mudou para a sua próxima aventura.

"Encontrei coisas assustadoras nas montanhas, quando se sabe que se está num lugar onde muitas pessoas perderam a vida, seja no Eiger [Alpes suíços] ou na Cordilheira dos Andes. Pode-se deparar com restos humanos e isso pode ser arrepiante”, disse à Radio Times no final do ano passado, recuperada após terem sido identificados os seus próprios restos mortais a 24 de junho no Monte San Antonio (conhecido localmente como Mount Baldy), a norte de Los Angeles (Califórnia).

E acrescentava: "Não é necessariamente sobrenatural, possivelmente é muito natural - o que chamaria de hipernatural. Está-se na presença da grande natureza e a grande natureza está a revelar-se em todo o seu poder. Isso pode levar-nos para além de um limiar de hipersensibilidade, para um domínio das forças naturais".

O ator também esclarecia que a sua "versão de Los Angeles não é piscinas e festas… São cascavéis, ursos, pumas, montanhas” e descrevia a sua atividade como um "conforto e uma espécie de autonegação existencialista, mas igualmente uma autoafirmação".

"Se se consegue lidar com montanhas perigosas, certamente que se consegue lidar com a vida como ator – as duas são bastante complementares", explicava.

Com 64 anos na altura, Sands rejeitava a ideia de que já era demasiado velho para o alpinismo, embora reconhecesse que tinha cada vez menos amigos a acompanhá-lo, pela idade ou porque, "com as mudanças climáticas, as superfícies rochosas tornaram-se muito mais instáveis".

"Se não se tiver mesmo vontade, a disciplina para subir um percurso, se não se estiver completamente empenhado, torna-se muito mais perigoso e é uma experiência muito mais vazia. Encontrar pessoas cuja companhia aprecio em condições tão estressantes e próximas não é fácil", contava.

"O problema do alpinismo é que se está sempre a fazer planos e a procurar trilhas - talvez se termine por chegar a 5% de todas as coisas que se planeou fazer", notava.

"Quarto Com Vista Sobre A Cidade"

Da mesma geração de Daniel Day-Lewis, Colin Firth, Hugh Grant, Kenneth Branagh e Rupert Everett, Julian Sands começou com papéis secundários no vencedor dos Óscares "Terra Sangrenta", de Roland Joffé, e no popular "Oxforx Blues", protagonizado por Rob Lowe ("A Descoberta" em Portugal), ambos de 1984.

A notoriedade surgiu com o sucesso como protagonista ao lado de Helena Bonham Carter de um dos beijos mais célebres da história do cinema no drama romântico "Quarto Com Vista Sobre A Cidade", de James Ivory (1985), seguido por "Gothic - Poetas e Fantasmas", de Ken Russell (1986).

Optando por se mudar para Hollywood para entrar em filmes americanos, fez todo o tipo de produções,de maior ou menor qualidade, mas que raramente cumpriram a promessa revelada pelos trabalhos iniciais.

Entre os melhores estão os títulos da saga de terror "Warlock", conhecidos em Portugal por "Sortilégio" e "Sortilégio 2: o Juízo Final", de 1989 e 1993, como um mago que viajava do século XVIII para o século XX, onde continuava a ser perseguido pelo caçador de bruxas interpretado por Richard E. Grant (no primeiro filme).

"Warlock"

Outros títulos importantes nesta primeira fase foram "Aracnofobia" (1990); "O Festim Nu", de David Cronenberg (1991); "Paixões Secretas de Uma Mulher" (1991); e o muito controverso na sua época (1993) "Boxing Helena" ("Paixão Selvagem"), realizado por Jennifer Lynch (filha de David).

Houve ainda filmes de Mike Figgis: "A Versão Browning" (1994), o vencedor dos Óscares "Morrer em Las Vegas" (1995), "Cúmplice à Noite" (1997) e "Timecode".

Já numa fase descendente, os filmes com mais visibilidade foram "The Million Dollar Hotel", de Wim Wenders (2000); "Vatel", de Roland Joffé (2000); "O Medalhão" (2003); "Romasanta" (2004); "Ocean's Thirteen", de Steven Soderbergh (2007); a versão americana "Millennium 1: Os Homens Que Odeiam as Mulheres", de David Fincher (2011); e "The Painted Bird", de Václav Marhoul (2019).

Em televisão, destacam-se a interpretação do terrorista Vladimir Bierko na quinta temporada de "24" (2006), Jor-El em dois episódios de "Smallville" (2009-2010), Miles Castner na oitava temporada de "Dexter" (2013) e William Jagger na série "Crossbones".

Mais bem recebidas foram várias passagens pelos palcos na última década, incluindo sob a direção de John Malkovich.

Deu ainda voz à personagem DeFalco no jogo "Call of Duty: Black Ops 2".