Intitulado "Garantir BD", o projeto é uma ideia do editor José Hartvig de Freitas, proposto com o objetivo de apoiar autores, desenhadores, tradutores, ‘designers’, num contexto de pandemia da COVID-19, e publicar obras de e sobre BD portuguesa, que estão agora a chegar às livrarias.

"A ideia do projeto foi que todo o dinheiro do Garantir Cultura fosse para trabalhadores e colaboradores, e que nós, do nosso lado, meteríamos do nosso bolso o dinheiro para a impressão dos livros", explicou José Hartvig de Freitas, do projeto editorial A Seita.

Com um montante de cerca de 80.000 euros, o projeto foi financiado em cerca de 60% do investimento total pelo programa Garantir Cultura, um mecanismo de apoio criado pelo Governo em 2021 para apoiar o setor cultural na recuperação face aos impactos da pandemia da COVID-19.

No caso da banda desenhada, José Hartvig de Freitas recordou que, durante o período mais difícil da pandemia - de confinamentos e encerramento da atividade cultural -, houve "uma subida importante nas vendas 'online'" e "a comunidade da BD uniu-se bastante para comprar livros aos editores e às livrarias".

Ainda assim, houve perdas gerais de receitas. "Para os autores portugueses foi pior, porque deixou de haver eventos", como festivais, e encontros literários, que "representam uma percentagem de venda muito grande", lembrou José Hartvig de Freitas.

O apoio financeiro do Garantir Cultura serviu para, por um lado, "editar livros sobre BD que tinham, às vezes, anos, e que são livros caros e difíceis de fazer" e, por outro, "fazer alguns livros de BD de autores portugueses a quem por uma vez, remunerássemos bem, pagando algo que compensasse o trabalho por uma vez, dando trabalho a tradutores, designers, legendadores e pagar-lhes um pouco melhor", disse.

É pelo "Garantir BD" que foram planeados oito livros, entre os quais "Imagens de uma revolução: O 25 de abril e a BD", o livro ensaístico assinado por João Miguel Lameiras, João Paulo Paiva Boléo e João Ramalho-Santos, sobre a forma como a banda desenhada abordou "o período da ditadura salazarista, da guerra colonial e da revolução de 25 de Abril que lhes pôs termo".

A este livro, que teve uma primeira distribuição em abril com o jornal Público e que chega agora às livrarias, junta-se "Variantes - Uma homenagem à BD portuguesa", no qual vários desenhadores portugueses recriam pranchas emblemáticas da nona arte nacional, de "Apontamentos de Raphael Bordallo Pinheiro sobre a Picaresca Viagem do Imperador do Rasilb Pela Europa" (1872) a "Tu És a Mulher da Minha Vida, Ela a Mulher dos Meus Sonhos" (2000), de João Fazenda e Pedro Brito.

A Seita editará ainda "Conversas de BD: Entrevistas a autores portugueses", de João Miguel Lameiras e Carina Correia, que reúne oito "entrevistas de fôlego" a outros tantos criadores portugueses, e "Tex: Mais que um Herói", de Mário Marques, "um dos maiores conhecedores e especialistas mundiais desta personagem icónica dos 'fumetti', a banda desenhada italiana nascida no pós-guerra".

Sobre o panorama atual da banda desenhada, uma área na qual tem sido um dos mais ativos agentes na edição, José Hartvig de Freitas considera que, “independentemente dos apoios, tem havido muita produção e muita vontade dos autores portugueses de fazerem BD”.

“A grande questão é o tempo de produção de um livro, que está dependente da disponibilidade do autor”, que raramente se dedica apenas à BD, disse.

No Garantir BD, apoiaram a produção de quatro obras: O autobiográfico “Juventude”, de Marco Mendes, que também estende a noção do que é uma banda desenhada e que foi editado no verão, e “Dragomante II: Prova de Fogo”, sequela do premiado “Dragomante: Fogo de Dragão” (2018), de Manuel Morgado e Filipe Faria.

O projeto de A Seita apoiou ainda a produção de “O Bestiário da Isa”, de Joana Afonso, e “Quero Voar”, de Cátia Sousa, que assina Kachisou e que se insere no universo da mangá.

Na chegada destas obras ao circuito das livrarias, José Hartvig de Freitas reconhece “uma subida gradual, mais geral, dos preços dos livros, por causa do aumento do custo da energia e do papel”. “Noto os clientes a queixarem-se muito”, lamentou.

Outra das vertentes do projeto Garantir BD, cumprindo o objetivo de trabalhar “com autores nacionais e para os autores nacionais”, é a projeção internacional.

José Hartvig de Freitas explicou que uma parte do apoio será para encomendar traduções, sobretudo para vendas 'online' e para divulgação de autores portugueses junto de editoras estrangeiras, em particular em formato digital.

E o editor recorda que não há um programa de apoio à edição de banda desenhada em Portugal, elogiando, ainda assim, a existência dos apoios da Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas, na tradução e publicação de BD e ilustração portuguesa no estrangeiro.

"Eu queria motivá-los a que eles fizessem um programa de apoio a artistas portugueses que foram editados no estrangeiro e não estão editados cá, porque os livros são caros", disse.