Sentados no meio do chão. As perninhas à chinês. À falta de fogueira, o sol aqueceu. Não foram mais de 15 minutos. Tempo mais que suficiente para umas boas gargalhadas, algumas confissões, momentos profundos, e mais algumas boas gargalhadas. O Alex e o Ben, unha com carne, foram boa onda. E, mais tarde, o concerto dos D'Alva, no Palco Antena 3, foi um tsunami. Ao ponto do público migrar de Rodrigo Amarante para os ver. Desfrutem tanto da leitura quanto nós desfrutámos da conversa.
Alex, como é que estás a lidar com a fama depois de teres aparecido na Rolling Stone (referência a Gbenga Adeleken, baixista dos Metronomy)?
Alex: Epa, a fama, o sucesso, as mulheres, o luxo. Eu hoje comi caviar ao pequeno almoço (risos).
Sonhas um dia aparecer em alguma capa de revista?
Alex: Não sei. Talvez. Já quis mais. Houve uma altura que eu gostava bué de aparecer na Bravo (risos). Na Men'sHealth também, mas eu não tenho corpo para isso. Eu comprava a Bravo quando era miúdo. Tinha posters de System of a Down. Tinha posters de Evanescence. Eu ouvia bué essas bandas. Eu ouvia Avril Lavigne.
Ben: Podemos morrer e aparecer na BLITZ.
Façam isso mais tarde. Fiquem connosco, por agora.
Alex: Mas se morrermos agora aparecemos já (risos).
Os D’Alva surgiram há relativamente pouco tempo, em 2013, e já estão em festivais como o Alive, o SBSR, também vão passar pelo Bons Sons, pelo Mêda +... Como é que tem sido para vocês lidar com este crescimento tão exponencial?
Alex: De facto, foi bué rápido. O disco fez um ano agora. E nós estávamos a tocar há meio ano antes do disco. O nosso primeiro concerto foi no Vodafone Mexefest 2012. Depois, só voltámos a tocar no verão, após sair o disco. Foi uma surpresa, claro.
Ben: Eu acho que, acima de tudo, está a ser uma aprendizagem. Estávamos, ainda há bocado, a falar com o Fred, que está cá com a Banda do Mar, e ele estava a dizer exatamente isso, que o nosso aparecimento é assim meio repentino. A conversa que tivemos com o Fred foi super didática. Uma das coisas que tem acontecido é podermos conversar e aprender com as pessoas que temos conhecido, que nos ajudam a saber manobrar a rapidez com que as coisas estão a acontecer.
Quão difícil é manter os pés assentes na terra?
Ben: Para nós, não é assim tão difícil. Mas há sempre alturas em que é um bocado mais difícil.
Com tantos concertos, com o pessoal a curtir o vosso som, a saber as vossas letras de cor, não sentem necessidade de alargar o vosso repertório?
Alex: O nosso repertório é muito bom para festivais. Às vezes até parece que temos canções a mais. Para o concerto de hoje foi um pouco assim. Tivemos de fazer uma espécie de 'Best Of' de D’Alva – e só temos um disco! Mas quando tivemos de fazer um espetáculo de auditório, como foi no CCB, tivemos de repensar muita coisa, fazer arranjos diferentes.
Ben: E aí fez falta ter mais reportório. Não é uma urgência. Nós não sentimos que não temos músicas suficientes para tocar.
Por vezes, há um bocado a tendência para o desgaste, quando se está sempre a ouvir o mesmo. Acham que isso ainda não está a acontecer?
Ben: Essa pergunta tem duas respostas. Por um lado, não. Por outro lado, sim. Quem consumiu o nosso disco, fê-lo numa velocidade tão vertiginosa. Quem apanhou o disco no início, durante dois meses não ouvia outra coisa. Há pessoas que ainda dizem que meteram o CD no carro desde que o compraram há um ano e ainda não o tiraram. Para essas pessoas, é óbvio que é importante haver mais canções de D’Alva. Nós já estamos a trabalhar em música nova, mas com calma. Já temos ideias claras do que vamos fazer a seguir, mas não é para já.
Tanto nos vossos temas, como na vossa abordagem nas redes sociais, vocês têm uma linguagem muito própria, muito à cibernauta. Donde é que vem esse apreço pelas hashtags #nqs (não quero saber) e #sqn (só que não)?
Alex: Nós usamos a internet como as pessoas que nós conhecemos usam. Não fazemos nada demais. O que eu digo sempre é: eu aprendo bué com os meus amigos. Porque eu acho piada às cenas que eles fazem. Por exemplo, o #prayfordalva apareceu porque uma amiga nossa foi fazer o exame de condução e escreveu #prayfordebora.
Então, isso reflete, de certa forma, a vossa aproximação às pessoas?
Alex: Claro que sim.
Ben: A maior parte dos hashtags que usamos, tirando o #LLS e o #somosdalva, que é mesmo nosso, são os que toda a gente usa.
É que, por norma, as bandas e artistas têm sempre uma linguagem muito mais institucional.
Alex: Se assim for, não há necessidade de utilizares a internet. A internet serve para tu te relacionares com as pessoas.
Como é que surge o #somosdalva? Parece assim um movimento do estilo #rumoao34.
(risos)
Alex: No ínicio, antes de existir D’Alva, o Ben estava a produzir aquilo que seria o meu disco a solo. Mas ele não só produzia, como fazia canções comigo e também tocava ao vivo. E a banda que toca connosco ao vivo, ainda hoje é composta pelas mesmas pessoas. E nós funcionávamos - e ainda funcionamos muito - como uma banda. E havia a necessidade de tornar a coisa coletiva. Nem eu me sentia bem estar a ser só Alex D'Alva Teixeira, ser só a minha cara. O Ben, no início, quando estávamos a perceber o que é que íamos fazer com o Alex, achou que o nome devia ser só “D’alva”. Mais tarde, quando surge a necessidade de fazer um coletivo, eu pensei por que não #somosdalva? E ficou o hashtag.
Não sei se vocês sabem, mas existe uma farmácia chamada Dalva, na zona do Saldanha. Vocês acham que a vossa música tem propriedades curativas?
Alex: Talvez...
Ben: Psicotrópicas.
(risos)
Alex: Há pessoas que dizem que a nossa música as deixa mais animadas. Houve uma altura em que eu estava bué mal na vida. Estava bué triste. Porque não dormia quase nada. Porque tinha de trabalhar imenso e depois tinha responsabilidades com uma banda e com uma família. E ouvia o nosso disco todos os dias antes de ir para o trabalho e ficava bué contente. Todos os problemas do mundo iam embora. Era assim o arco-íris. Há bué gente que diz que o "Batequebate" é o CD para ouvir antes de ir para o trabalho ou para a escola.
Ben: Há pessoal que diz que é óptimo para estudar para os exames.
Alex: São smart drugs (risos).
Muitos artistas atribuem alcunhas aos seus fãs. Os do Justin Bieber são os ‘Beliebers’. Os da Lady Gaga são os ‘Little Monsters’. Os da Miley Cyrus são os ‘Smileys’. Os vossos são os “Migz”.
Alex: Mas isso foi do nada. Surgiu do nada.
Ben: Mais uma vez, é tudo natural. ‘Migz’ é uma expressão que nós usamos quando estamos juntos.
Alex: É uma expressão brasileira. Foi um amigo nosso, que usava ‘migz’ para toda a gente. Não tem género. Pode ser singular ou plural. Dá para toda a gente, é super inclusivo.
Ben: [tira o telemóvel do bolso] Olha, esta foi a última mensagem que eu mandei ao Alex: “Migz, temos que bazar”. É assim que nós falamos. Acima de tudo, eu penso que o que pauta a maneira como temos feito tudo é a naturalidade.
Alex: Há músicas que nós demoramos muito mais tempo a fazer, porque é muito mais importante o tempo em que eu e o Ben passamos só a ‘hangar’ e a estarmos juntos, do que propriamente a tentar descobrir qual é a melodia, qual é o ritmo...
Vimos uma foto vossa, tirada pela Vera Marmelo, abraçados e a chorar depois do concerto no Alive. Este momento é um reflexo desse tempo que investem na vossa amizade?
Ben: Isto está a ficar ‘deep’.
Alex: Let’s go deep.
(risos)
Ben: A maior parte das pessoas não sabe, mas exatamente na altura em que nós sabemos que vamos editar pela NOS Discos, eu fui diagnosticado com uma depressão muito grave. Durante a caminhada pré-disco, eu comecei a ser acompanhado. Uma das coisas que acontece no início, é que tu tomas medicação cujo objetivo é suprimir qualquer tipo de sentimentos mais fortes, sejam bons ou maus. Eu já há imenso tempo que estava sem sentir nada de muito extremo e nesse dia houve um pico. Acabou o concerto, eu dei o baixo a alguém e, nesse preciso momento, caiu sobre mim o que tinha acabado de acontecer. Senti uma emoção que já não sentia há uns três ou quatro meses. Aliás, estou a pensar nisso e a ficar arrepiado agora. Caíram-me lágrimas, que era uma coisa que já não acontecia porque as drogas não o permitiam. Foi um momento super intenso. Mais pessoas da nossa banda começaram a chorar. Foi um momento mágico e só a Vera para o poder captar daquela maneira. Para mim, foi o dia em que eu voltei a sentir alguma coisa.
Voltando agora a um registo menos ‘deep’. Estas palavras são-vos familiares? “Vou beijar na boca, quero namorar. Sair para a balada, sem ter hora para voltar. Livre, Leve e Solto, para poder voar.”
Alex: Eu acho que já ouvi isso numa novela. O “Livre, Leve e Solto” aparece porque a minha mãe é brasileira. E ela tem várias frases muito próprias. A nossa maneira de escrever é: eu escrevo bué cenas e depois o Ben faz a curadoria dos versos. Nessa altura, eu tinha páginas e ele só sublinhou “Livre, Leve e Solto”.
Deve ser mesmo uma expressão brasileira, porque também é usada pelo MC Lukinhas: “Ela manda mensagem, me liga, me atazana no baile. Quer grudar igual chiclé. Mas aqui no meu pé só tem lugar pro Nike. Me conheceu assim, agora vem metendo o louco. Para ninguém é novidade, eu sou livre, leve e solto.”
(risos)
Alex: Nada a ver com isso. Nada a ver com vida louca.
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