Depois de no dia do seu aniversário nos ter revelado "Planetário", com Mallu Magalhães, Capicua volta a apresentar mais uma colaboração, desta vez com o fadista Camané. O novo single, "Passiflora", já se encontra disponível nos serviços de streaming de música.

"Em 'Passiflora', Capicua junta-se a Camané num tema que fala sobre a relação da artista com a indústria musical e seus desconfortos. Um tema novamente com música e produção do parceiro de longa data Stereossauro", explica a Universal Music em comunicado.

Capicua conta que a "letra parte do mote dado pelo sample da Amália – ‘Cantar como quem despe’ para falar da entrega de quem canta por primitiva necessidade e, simultaneamente, por abnegado e derradeiro altruísmo". "E desdobra-se, nesta segunda versão, para falar sobre a minha relação com a indústria musical, com a crítica, com a promoção dos discos e a gestão das expectativas que os outros têm em relação ao meu trabalho. Basicamente é a catarse do lado menos romântico do ofício... É um tema emocional, rimado em crescendo como quem canta o fado, que culmina com o refrão do Camané (perfeito), que mantive intacto no fim", frisa.

LETRA:

Passiflora, estranha e bela como a do maracujá
A minha flor é Florbela e espanca o teu patoá
Não me espanta se essa gera não me alcança e digo já
Pra essa fauna, como Flora eu vou só “deixá brilhá”.
Vou sem culpa, sou adulta, e muito culta para agradar
Estou na luta e na disputa não me custa dominar!
Fosse fácil, eram muitas, se fosse doce eram mais
Não me moldo nem ao soldo, nem à bênção dos demais.
Eles preferem os discos que ainda não saíram
Eles preferem promessas daqueles que desistiram
Eles preferem os mitos dos que podiam ter sido
Dos que podiam ter feito, do que queriam ter ouvido.
Preferem os mortos, eles fartam-se dos vivos,
Eles fartam-se dos discos, eles preferem os vídeos,
Eles querem-nos mansos, criados, mal sucedidos
Se não somos vendidos, somos pouco alternativos.
E se sai um disco novo perguntam quando é o próximo
E em seguida disso “porquê o pseudónimo?”
E é óbvio, pérolas a porcos
Com as feras a postos, só para te mastigar...

Estou farta de snobes que se dizem estetas
com síndroma de porteiro de discoteca!
Não sou cool pra esses cínicos,
Nem nova pra esses críticos
Que procuram girinos de novas cenas indígenas.
Farta de sabidos pseudoprofetas
“Júlio Isidros” dessas raras descobertas.
Não sou teen pra esses putos
Nem ligo puto a esses grupos
Os que ditam o futuro do mundo, estou nos antípodas.
Dizem-se lendas quando as lendas somos nós
E não sabem que na história, nem vê-los, estaremos sós!
E depois os puritanos, que desdenham do sucesso
E depois de tantos anos se defendem no começo
E que eu conheço do meu tempo e a quem digo que o que eu faço
É o mesmo de sempre, é hip hop clássico!
E não disfarço que o levo a novo público
Que eu abraço e acolho com orgulho
E que o hip hop que eu quero para o futuro,
não será conservador, nem machista, nem burro!
Por isso estranhem-me, porque eu entranho-me
fora da caixa, Passiflora, mantenho-me!
Por isso apanhem-me, se conseguirem,
eu fujo à regra porque a regra restringe-me!
E se me afasto não será presunção
A distância entre nós é só a comparação...

Não fiz hits de verão e não é por não saber como
Não sou cena do momento e ao tempo que eu estou no topo
Não confundam o bom gosto com falta de público
E aproveitem este disco porque pode ser o último!
Na net a novidade é um triz, diz:
Se andas anos nisto é do risco que vives?
Selfies dão mais likes que um disco, diz-me:
Porque é que fazes isto, porque é tu que insistes?
Se é trap não é rap, se é hit leva hate,
Boom bap é retrocesso, se é sucesso já é fake
Se tem putos bota fora, se não tem views é um flop
Se é adulto já é cota, transversal não é hip hop
“É conhecido? Já não curto, curtia mais o primeiro.”
“É repetido ou muda muito, não vale a pena o dinheiro”
Se fosses mais bonita, mais sexy, na moda
Ou um homem, mais jovem, mais dentro da norma...
Terias mais alcance, mais chance, na indústria
Se fosses mais dócil, mais fácil na música?
Terias mais views, mais likes, mais público,
Se fosses mais hipster, se fosses mais estúpida?
Terias mais fãs, mais buzz, mais glória?
Para quê o hype se eu prefiro fazer história?
Passiflora, a minha beleza é estranha
Meu fado chora mas move montanhas.

Eu ofereço a minha voz
Flor que se dá
Estranha e bela
Como a do maracujá.