"Autodidata, tanto por condição como por convicção, Agustina impôs-se como uma das vozes mais inoportunas da literatura portuguesa", disse Ana Pinho ao abrir a sessão que antecipou a inauguração de "Uma Exposição Escrita: Agustina Bessa-Luís e a Coleção de Serralves".

Para a presidente da fundação portuense, "ao questionar tudo o que parecia acondicionado, devidamente arrumado, pacificado", a romancista "sempre foi ao fundo das questões que lançou ao seu tempo, que é também o nosso tempo".

Para Ana Pinho, Agustina fez-se "historiadora das ideias por sempre ter desconfiado dos feitos e das narrativas de que estes feitos são feitos", reclamando também "um lugar que a coloca algures entre a psicóloga atenta ao gesto, aparentemente, mais insignificante, e a socióloga que não ensaia grandes explicações totalizantes, mas, antes, não se furta às perguntas fundamentais".

"Agustina é um espírito anarquista singular, ora disciplinada, ora indisciplinadora", vincou, recordando que "a sua verve demolidora desafiou os lugares comuns e o politicamente correto, alimentando confrontos profundos e admiravelmente violentos".

A responsável recordou também que Agustina Bessa-Luís "tinha por Serralves, que tratava por jardim, uma enorme admiração", tendo com a fundação "uma vivência próxima e ativa", também por ter sido administradora entre 1994 e 1996, e "fundadora honorária desde 2008".

"Um dos mais enérgicos furacões das letras portuguesas do século XX. Um exemplo de força, um apelo à liberdade", evocou Ana Pinho, lembrando ainda o lançamento de "Agustina Bessa-Luís - Escritos sobre Cinema", uma coletânea de crítica de cinema e ensaios sobre filmes, realizadores ou atores.

Na sessão de abertura interveio também a artista e filha de Agustina Bessa-Luís, Mónica Baldaque, que dedicou as celebrações do aniversário a quem conheceu a mãe "pela leitura, pelo estudo, pela crítica, pelo convívio".

"Dedico, de maneira particular, a Maria Leonor Cunha Leão, da Guimarães Editores, editora da Sibila (1954) e de toda a obra, que se tornou amiga de minha mãe", afirmou Mónica Baldaque.

Já António Fontainhas Fernandes, comissário das comemorações do centenário do nascimento de Agustina Bessa-Luís, assinalou que "o Norte mobiliza-se para homenagear uma figura única da cultura e da literatura portuguesa, conhecida pela sua erudição, pela experiência de vida e, principalmente, pela sua inegável contribuição para o enriquecimento do indivíduo e da sociedade".

Por seu lado, o presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N), António Cunha, destacou o "ato de agitação" causado pelas comemorações do centenário.

"Nos últimos dias, e já esta manhã em Amarante, na abertura oficial destas comemorações, sentimos o vigor dessa agitação", especificando-a como cultural, politico-cívica e regional, pois "sendo universal, Agustina é profundamente portuguesa e eminentemente nortenha".

Já Filipe Araújo, vice-presidente da Câmara do Porto, recordou que Agustina, em grande medida, "forjou a sua identidade pessoal e literária" no Porto, vincando "a relação especial" que a escritora tinha com a cidade.

"Se é certo que o enraizamento portuense da escritora influenciou a sua vida e obra, também não é menos verdade que o Porto ganhou uma outra aura, uma outra dimensão, nos livros de Agustina", considerou.

O centenário do nascimento de Agustina Bessa-Luís comemora-se hoje, em várias cidades do país, com um conjunto de iniciativas destinadas a valorizar e promover o legado artístico e cultural, assim como os vínculos territoriais, da escritora.

Os principais eixos do programa, que arrancaram hoje em Amarante e se prolongam até outubro de 2023, centram-se, em especial, no roteiro dedicado aos lugares de Agustina, que nasceu em Amarante, viveu no Porto e tem uma forte ligação ao Douro e ao Minho.