Quase à hora marcada, JP Simões entrou com três livros debaixo do braço. Anunciou que iria ler quatro textos e depois, se o público se portasse bem, cantava uma “canção de zombies”. E o público portou-se bem enquanto JP leu Charles Mingus, Herberto Hélder e Alexandre O’Neill sem grande virtuosismo mas com bastante ironia.

Foi apenas à quarta leitura, uma adaptação de uma crónica de Lobo Antunes, que a leitura de JP Simões ganhou outro ânimo. Talvez pelo tom cáustico, mais próximo daquele a que estamos habituados, ou pela possibilidade de enfatizar pormenores, frases, gestos...

E, como o público se portou bem, mereceu uma música nova. “A Marcha dos Implacáveis”, uma canção “sobre a crise”, como afirmou, teve direito a imitação de trompetes e do Presidente da República. E, no final, ainda “Inquietação”, de José Mário Branco.

A actuação terminou e o silêncio também desapareceu por momentos. Até Ursula Rucker chegar ao palco. Silenciosa e de mala a tiracolo. Avisou que se sentia “nua” por não ter os seus músicos com ela desta vez. Mas não temeu e arremessou “Electric Santeria”, que definiu como “uma prece”.

Nesse primeiro poema, a certa altura, pediu que as suas palavras fossem aguçadas. E foi assim que a ouvimos o resto da noite. Frontal, honesta, forte. Mesmo quando se mostrava frágil, porque é necessária firmeza para exibir assim a fragilidade. “Supa Sista”, “Ever heard of it”, “Brown Boy”, “What a Woman must do” foram alguns desses momentos em que a verve se juntou à mensagem de Ursula Rucker.

A certa altura, JP Simões (ou simplesmente João, como Rucker o chamou) voltou para a acompanhar em “She”. Foi o único momento em que Ursula não esteve sozinha com os seus poemas, em cima do palco. Mas nesta espécie de comício político pelas emoções, a norte-americana raramente esteve solitária. O público acompanhou-a e, caso lhes perguntassem no final, decerto votariam nela em qualquer eleição.

Texto: Frederico Batista

Fotos: Vera Moutinho