Dos EUA ao Japão, da França à China, as longas-metragens estão a voltar a comandar a maioria das atenções no
Festival Internacional de Cinema de Animação de Annecy, a decorrer até 12 de Junho. Se a competição de curtas-metragens continua a ser o núcleo principal do certame, a sua importância ombreia cada vez mais com a dos filmes longos, cuja produção sofreu um «boom» na última década. Só este ano, foram propostas quase 50 longas-metragens a competição, um número de filmes que, antes dos anos 90, nem cabia numa década inteira de produção.

Dito isto, na competição propriamente dita, a qualidade não foi tão alta como a que se assistiu nos últimos três anos, quando o número delas em competição duplicou. Se o ano passado concorreram ao grande prémio filmes de tanta qualidade como
«Coraline»,
«Mary and Max»,
«My Dog Tulip» e
«Brendan and the Secret of Kells», este ano, entre sete filmes em competição, só dois chegaram aos calcanhares das propostas acima:
«O Fantástico Senhor Raposo», de
Wes Anderson, que a maioria do público já conhecia, e o excelente
«Summer Wars», de
Mamoru Hosoda, o cineasta japonês que já é considerado o sucessor espiritual de
Hayao Miyazaki e que já brilhara há três anos em Annecy com o excelente «The Girl Who Lept Through Time», que então ganhou o Prémio do Público. Já apresentado em Portugal no IndieLisboa, é a melhor aposta da competição, que só poderá ser prejudicado na atribuição de prémios se o júri torcer o nariz ao seu extremo profissionalismo em detrimento de obras mais experimentais mas infinitamente menos conseguidas.

O Japão conseguiu colocar ainda outro filme na competição,
«One Piece Film: Strong World», o décimo de uma série muito célebre no País do Sol Nascente e que por lá teve um imenso sucesso de bilheteira mas sem qualidade que justifique a presença numa competição deste nível, principalmente quando ficaram de fora outros três filmes nipónicos com mais potencialidades, apresentados nas secções paralelas do festival:
«Yona Yona Penguin», de
Rintaro,
«Redline», de Takeshi Koike, e
«Mai Mai Miracle», de Sunao Katabuchi.

Da França surgiram dois filmes, um de presença também incompreensível na selecção,
«Allez Raconte!», de Jean-Christophe Roger, uma comédia de animação muito limitada e baseada numa BD de Lewis Trondheim, e o muito simpático
«Kerity La Maison des Contes»,uma fábula infanto-juvenil de Dominique Monféry plasticamente bem conseguida sobre o poder da imaginação e o amor à leitura.

Dois dos filmes mais discutidos, com opiniões muito diversas entre o público, foram o sueco
«Metropia», de Tarek Saleh, retrato desequilibrado de uma sociedade distópica do futuro que faz uso de uma técnica de deformação de figuras humanas, e
«Piercing 1», primeira longa-metragem de animação chinesa feita de forma independente, escrita e animada por Liu Jian, que é um brutal retrato urbano da China actual, muito débil em termos de animação mas curioso como imagem de uma realidade que urge conhecer.

Fora de competição, quase sempre em antestreia europeia, foram apresentados
o excepcional «L'Illusionniste», o novo filme de
Sylvain Chomet baseado num argumento de
Jacques Tati;
«Shrek para Sempre», na presença do realizador
Mike Mitchell e do produtor Jeffrey Katzenberg,que não traz grande novidade às fitas anteriores e promete ser a última da série (se não considerarmos que há um novo filme do Gato das Botas a ser preparado...); o muito divertido
«Despicable Me», em antestreia mundial em Annecy e com a presença dos dois realizadores, ambos franceses, Pierre Coffin e Chris Renaud; e ainda
«Le Voyage Extraordinaire de Sammy», o novo filme do belga
Ben Stassen a três dimensões, após
«Os Mosconautas no Mundo da Lua».

Isto para além de outros filmes apresentados noutras secções, nomeadamente a dedicada ao cinema animado argentino, celebrado este ano no certame, e a apresentação alongada de seis longas-metragens ainda inacabadas que prometem vir a dar que falar no futuro. A mais discutida é a estreia de
Patrice Leconte no cinema de animação com uma adaptação do livro
«A Loja dos Suicídios», de Jean Teulé.