"Anora" volta a destacar-se na temporada de prémios com uma vitória clara nos Independent Spirit Awards, os prémios para as produções norte-americanas feitas fora do circuito dos grandes estúdios de Hollywood que também têm categorias para as séries.

Melhor Filme de 2024, Melhor Realização para Sean Baker e Melhor Interpretação Principal para Mikey Madison foram os três prémios em seis nomeações que recebeu na 40.ª edição dos prémios do cinema independente.

Numa temporada inicialmente muito dispersa, a comédia dramática sobre uma trabalhadora de sexo que se envolve com a família de um oligarca russo recebeu os troféus que ganhou a Palma de Ouro do Festival de Cannes em maio tornou-se a favorita para os Óscares que serão entregues no próximo fim de semana (2 de março) após ganhar os importantes prémios dos sindicatos dos produtores americanos (PGA) e dos realizadores (DGA).

A cerimónia anual decorreu numa tenda gigante na praia da cidade californiana de Santa Mónica, em Los Angeles, e celebra apenas filmes feitos por menos de 30 milhões de dólares e que tenham um "significativo conteúdo americano" ou cidadãos americanos ou residentes permanentes em duas das três posições criativas de realizador, produtor e argumentista, critérios que deixaram de fora por exemplo "Emília Pérez", "Conclave" e "A Complete Unknown".

Embora tradicionalmente muitos dos títulos nomeados não cheguem aos cinemas portugueses, os 'Spirit' por vezes são uma "antecâmara" dos maiores prémios de Hollywood, já que as escolhas para Melhor Filme coincidiram em sete dos últimos 13 anos, incluindo com o recente “Tudo em Todo o Lado ao Mesmo Tempo” (2022). No entanto, os resultados dos 'Spirit' não podem influenciar a votação para as estatuetas douradas, que terminou no dia 18.

Ao ganhar o prémio principal, Sean Baker fez um apelo apaixonado para 'manter o cinema independente vivo'.

O realizador, há muito tempo uma figura importante do circuito de filmes independentes dos EUA, está agora a descobrir o sucesso 'mainstream' com um filme que custou apenas seis milhões de dólares.

"O cinema independente está em cada vez maiores dificuldades', alertou, notando que os artistas envolvidos recebem muito pouco dinheiro.

"Eu, pessoalmente, não tenho filhos, mas sei que, se tivesse, não seria capaz de fazer os filmes que faço [...], notou (curiosamente, Baker ganhou em Melhor Realização a Brady Corbet, na única nomeação de "O Brutalista", que causou impacto no início da semana ao dizer que 'ganhou 'zero dólares' com o seu filme e que a primeira vez que ganhou dinheiro em três anos foi com vários trabalhos publicitários quando passou por Portugal).

Com os prémios: Sean Baker e Mikey Madison

Baker disse que o colapso das vendas de DVD, que antes apoiavam cineastas promissores, significa que criativos como ele raramente ganham dinheiro, mesmo quando os seus filmes fazem sucesso nos cinemas. Alertou também que os grandes estúdios de Hollywood engolem os lucros, recusam "dar sinal verde" a filmes que abordam assuntos controversos e forçam os realizadores a escolher atores com base em "quantos seguidores têm nas redes sociais".

E acrescentou: "Sou um adepto do cinema independente... o sistema tem que mudar porque isto é simplesmente insustentável. Não devíamos estar apenas a sobreviver", notou.

"Não nos desvalorizemos ainda mais", disse, apelando para que agentes, financiadores e estúdios ajudem os realizadores criativos a "manterem o cinema independente vivo".

Já Mikey Madison voltou a ultrapassar Demi Moore, tal como aconteceu nos BAFTA da Academia Britânica, confirmando que a categoria de Melhor Atriz nos Óscares está longe de estar garantida para a protagonista de "A Substância" (as duas voltam a competir este domingo nos prémios do sindicato dos atores, a última grande cerimónia antes da grande noite de Hollywood).

Os outros nomeados em Melhor Interpretação Principal, uma categoria sem distinção de género, eram Amy Adams por "Nightbitch", Ryan Destiny por "The Fire Inside", Colman Domingo por "Sing Sing", Keith Kupferer por "Ghostlight", Hunter Schafer por "Cuckoo", Justice Smith por "I Saw the TV Glow", June Squibb por "Thelma" e Sebastian Stan por "The Apprentice".

Ainda em cinema, Kieran Culkin venceu na categoria de Melhor Interpretação Secundária por "A Verdadeira Dor", onde estavam nomeados Yura Borisov e Karren Karagulian ("Anora"), Joan Chen ("Dìdi"), Danielle Deadwyler ("A Lição de Piano"), Carol Kane ("Between the Temples"), Kani Kusruti ("Girls Will Be Girls"), Brigette Lundy-Paine ("I Saw the TV Glow"), Clarence Maclin ("Sing Sing") e Adam Pearson ("A Different Man"). Para o filme do ator, realizador e argumentista Jesse Eisenberg houve ainda um segundo troféu, o de Melhor Argumento.

O outro filme a receber dois prémios foi "Dìdi": a comédia dramática de Sean Wang foi eleita Melhor Primeiro Filme e Primeiro Argumento.

"Flow - À Deriva", uma animação da Letónia sem diálogos sobre animais a unir-se para sobreviver a um misterioso dilúvio, ganhou o prémio de Melhor Filme Internacional.

O Melhor Documentário foi para "No Other Land", sobre a destruição de uma aldeira na Cisjordânia ocupada. É o favorito para ganhar o mesmo prémio nos Óscares, mas ainda não conseguiu encontrar um distribuidor nos EUA.

"Nickel Boys", outro nomeado para o Óscar de Melhor Filme, sobre os abuso numa escola da Flórida e filmado inteiramente da perspetiva da primeira pessoa, ganhou o prémio de Melhor Fotografia.

"O Atentado de 5 de Setembro", sobre o massacre terrorista de atletas israelitas nos Jogos Olímpicos de Munique de 1972, ganhou o prémio de Melhor Montagem.

Já nos prémios para as produções televisivas, que fazem parte dos Independent Spirit Awards desde 2020 e não têm limite orçamental, o grande vencedor foi "Baby Reindeer", com três prémios: Melhor Interpretação Principal para Richard Gadd, Melhor Interpretação Secundária para Nava Mau e Melhor Revelação para Jessica Gunning.

"Shōgun", que liderava com cinco nomeações, ficou pelo prémio importante de Melhor Nova Série com Argumento, onde estava nomeada também "Baby Reindeer".

LISTA DE PRÉMIOS (CINEMA)

FILME: "Anora"

PRIMEIRO FILME: "Dìdi"

REALIZAÇÃO: Sean Baker ("Anora)

INTERPRETAÇÃO PRINCIPAL: Mikey Madison ("Anora")

INTERPRETAÇÃO SECUNDÁRIA: Kieran Culkin ("A Verdadeira Dor")

INTERPRETAÇÃO REVELAÇÃO: Maisy Stella ("My Old Ass")

ARGUMENTO: "A Verdadeira Dor"

PRIMEIRO ARGUMENTO: "Dìdi"

MONTAGEM: "O Atentado de 5 de Setembro"

FOTOGRAFIA: "Nickel Boys"

FILME INTERNACIONAL: "Flow - À Deriva" (Letónia)
DOCUMENTÁRIO: "No Other Land"

PRÉMIO ROBERT ALTMAN (para a realização, direção de casting e elenco): "As Três Filhas", para Azazel Jacobs (realização), Nicole Arbusto (direção de casting) e Jovan Adepo, Jasmine Bracey, Carrie Coon, Jose Febus, Rudy Galvan, Natasha Lyonne, Elizabeth Olsen, Randy Ramos Jr. e Jay O. Sanders (elenco)

PRÉMIO JOHN CASSAVETES (para filme feito por menos de um milhão de dólares): "Girls Will Be Girls"

PRÉMIO PRODUTORES (premeia os que revelam criatividade, tenacidade e visão para produzir filmes independentes de qualidade, apesar dos recursos muito limitados): Sarah Winshall

PRÉMIO ALGUÉM PARA ACOMPANHAR (cineasta com uma visão única ainda sem ter recebido reconhecimento apropriado): Sarah Friedland ("Familiar Touch")

PRÉMIO MAIS REAL DO QUE A FICÇÃO (realizador em ascensão de filmes de não-ficção ainda sem ter recebido reconhecimento apropriado): Rachel Elizabeth Seed ("A Photographic Memory")

LISTA DE PRÉMIOS (TV)

NOVA SÉRIE COM ARGUMENTO: "Shōgun" (Disney+)

NOVA SÉRIE SEM ARGUMENTO OU DOCUMENTÁRIO: "Hollywood Black"

INTERPRETAÇÃO PRINCIPAL EM NOVA SÉRIE COM ARGUMENTO: Richard Gadd ("Baby Reindeer") (Netlflix)

INTERPRETAÇÃO SECUNDÁRIA EM NOVA SÉRIE COM ARGUMENTO: Nava Mau ("Baby Reindeer")

INTERPRETAÇÃO REVELAÇÃO: Jessica Gunning ("Baby Reindeer")

ELENCO EM NOVA SÉRIE COM ARGUMENTO: o elenco de "Como Morrer Sozinha" (Disney+)