A abertura do concerto no Campo Pequeno deu-se com uma antiga “Johnny Yen” , estranha escolha que se direciona para uma espécie de antítese da ideia de que num concerto de rock o ponto de partida tem de ser, literalmente, “a abrir”. O vocalista pareceu percebê-lo, reconhecendo o caráter brando da receção: “No nosso primeiro concerto por cá vocês partiram tudo. Acho que a canção de abertura era esta”.

E então, com “Waltzing Alone”, tudo entra nos eixos. O tema faz parte da assinalável lista de deliciosos clássicos no melhor estilo romântico (no sentido da escola literária) poética que havia feito a glória de Manchester a partir dos anos 1980. Apesar de se terem iniciado como contemporâneos de bandas como The Smiths ou New Order, entre muitas outras, o sucesso e consagração dos britânicos vieram muito tempo depois – na mesma altura em que o grupo de Morrissey se estilhaçava, aliás.

Foram de quatro dos seis álbuns dos anos 1990 (“Gold Mother”, “Seven”, “Laid”, “Whiplash”) que saíram os fabulosos e irrepreensíveis êxitos (“She’s a Star”, “Born of Frustration”, “Laid”, “Out to Get You”, “Ring the Bells”, “Waltzing Alone”, “Come Home”) que puseram o Campo Pequeno a divagar, sonhar e dançar. Particularmente no hino “Sometimes” e o seu mítico refrão – “Sometiiimes... when I look into your eyes I swear I can see your sooooul”...

Para a banda, sempre enérgica, não houve economia em recursos humanos: multi instrumentistas revezavam-se e duplicavam muitas vezes alguns instrumentos – como as baterias e as guitarras. Às tantas, Booth arriscou o seu crowdsurf, “navegando” pelas mãos do público e regressando a palco. A vertente visual é simples, mas eficaz: dois ecrãs ao lado do palco davam a todos a possibilidade de uma visão minuciosa do que se passava entre clássicos e material do novo álbum - “All the Colours of You”, lançado em junho do ano passado e cuja produção enfrentou as habituais confusões geradas pela pandemia.

A faixa-título é um tema anti racista, apresentado por Booth como um canção construída enquanto vivia nos Estados Unidos e testemunhava as ações do governo de Donald Trump.

Faltou “Sit Down”; estava-se à espera para o segundo encore – mas em vez disso o vocalista voltou avisando que arriscava por o público “deprimido”, mas que gostavam muito da canção “Zero”, também do último álbum. Deprimente ou não (“We're all gonna die / That's the truth / Quit measuring time / By money and youth”), evitou o clímax final da mesma forma que no início. Mas, entre a despedida e o arranque, os sinos tocaram para uma peregrinação emotiva.