
Entre hamburgers e fajitas, gente sempre a passar e grupos que cantam os parabéns em zonas mais afastadas, a música arrisca-se a ficar para segundo plano e, pelo respeito que os músicos e o seu trabalho sempre me mereceram, a mistura de espetáculos e refeições nunca me apelou muito. No entanto, compreendo que, numa cidade (e num país) onde a música ao vivo continua sobejamente maltratada, o palco e as condições do Hard Rock Cafe sejam muito apetecíveis. Dan Reed, na sua segunda passagem por Lisboa, a solo, não pareceu importar-se e, como sempre, irradiou simpatia e iluminou a sala com a sua entrega total ao espetáculo.
É incrível como, por vezes, uma banda de cinco pessoas deixa uma sensação de vazio no espetador, e um homem acompanhado apenas da sua guitarra acústica consegue encher um palco, com um punhado de canções despretensiosamente belas.
O ambiente informal do Hard Rock resultou numa verdadeira noite de amigos – aqueles amigos que, mesmo não se conhecendo, sentem a cumplicidade de uma mensagem partilhada – quente, intimista e com sabor natalício. Talvez por se tratar da última data da digressão promocional do CD “Coming Up For Air”, de 2010, o próprio Dan Reed optou por não seguir um alinhamento fechado e, aqui e ali, foi aceitando pedidos do público, que oscilou entre temas a solo e os clássicos dos tempos dos Dan Reed Network.
“Only Love”, que abriu a noite, pouco antes das 23 horas, foi uma das poucas novidades para o público que também esteve com o músico norte-americano há cerca de um ano, na MusicBox. O tema é o primeiro do novo CD, “Signal Fire”, com lançamento oficial agendado para 16 de fevereiro, numa festa, em Praga, que irá assinalar, também, o 50º aniversário do artista.
Seguiram-se “Coming Up for Air”, tema título do primeiro álbum a solo, depois de uma saída autoimposta do mundo da música para uma viagem de descoberta,“Rainbow Child”, talvez o maior sucesso da era DRN, e “Holy Diver”, a homenagem habitual e sentida a Ronnie James Dio. De resto, a noite ficou marcada pela sucessão de temas a solo e com a banda, que se reunirá para um espetáculo comemorativo em Portland, terra natal de Reed, na noite de passagem do ano. O que significa que o público viajou entre a introspeção quase meditativa de temas como “Pray for Rain”, “Candlelight” ou o fantástico “Brave New World”, e todo o groove dos muito funky e exóticos Network, com “Wake Up”, “Stronger Than Steel”, “I’m Gonna get to You” ou “Salt of Joy”.
Dan Reed confessou todo o prazer que lhe dá recordar os tempos dos DRN, com quem passou pela primeira vez pelo nosso país, a abrir para Bon Jovi, corria o ano de 1989. Sozinho em palco, entra em transe, ausenta-se e passa para outra dimensão, onde canta, dança, exulta e sofre, como se de um ato de contrição se tratasse. E o público permanece suspenso em cada nota e em cada silêncio, testemunha de cada história descrita. Assim, a noite pareceu demasiado curta (apesar de ser domingo e do adiantado da hora, mas segunda feira podia esperar) e os pedidos de encore não se fizeram esperar, com “Closer” a abrir e “Signal Fire” como mais uma antecipação ao novo álbum.
“She’s Not You” ficou para as despedidas -um tema dedicado aos pais, já falecidos, com uma nota de esperança. Afinal, a sua principal mensagem, depois de uma vida vivida um pouco por todo o mundo e entre diferentes culturas, e que estará definitivamente presente no novo álbum.
A morar, presentemente, em Praga, e pai de um bebé de três meses, Dan Reed está a viver uma fase feliz da sua vida e, agora que redescobriu Lisboa e o público português, encontrou aqui mais um porto de abrigo, que estará sempre de braços abertos para o receber. Talvez já no próximo ano, com uma banda, para apresentar “Signal Fire”? Lá estaremos.
Liliana Nascimento
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