A HISTÓRIA: Shang-Chi terá de enfrentar o passado que julgava ter deixado para trás quando é atraído para a teia da misteriosa organização "Dez Anéis"..

"Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis": nos cinemas a partir de 2 de setembro.


Crítica: Daniel Antero

Artes-marciais e acrobacias, dragões e demónios, fantasia e heroísmo que vem das margens, o 25º filme do MCU mergulha na cultura asiática e traz de lá o orgulho para a representação que tanto faltava no seu espólio.

Depois da polémica em volta do "whitewashing" da personagem The Ancient One (Tilda Swinton) em "Doutor Estranho", a equipa de Kevin Feige procurou replicar o poder libertador de "Black Panther" - que introduziu uma perspectiva negra no universo Marvel - e colocou em foco neste novo filme o poder ancestral e moderno da cultura chinesa.

Realizado por Destin Daniel Cretton, que é asiático-americano, “Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis” conta com um elenco quase completamente oriental: Simu Liu no papel de Shang-Chi, Awkwafina como "sidekick" e "comic relief", Benedict Wong num "cameo" para prestar serviço, Fala Chen como musa e ainda os icónicos Michelle Yeoh e Tony Leung, este último como vilão amargurado, pai desesperado no seu destino trágico, num papel que só este catedrático do cinema de Hong Kong poderia elevar.

Filme que lida com o sentido de raízes, pertença, família, amor e perda, “Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis” explora uma família desfeita, os conflitos geracionais e o desprendimento das tradições. Com o equilíbrio bem-humorado entre Simu Liu e Awkwafina, dois actores cada vez mais exímios nos seus "beats" de diálogo rápido de "screwball", e com a carga dramática entre Wenwu (Leung) e os seus filhos Shang-Chi e Xialing (Meng'er Zhang), quase poderíamos estar a falar de uma comédia dramática "indie". Mas aqui há monstros, reinos secretos e reviravoltas do arco da velha. Mais concretamente dos tempos do "Homem de Ferro 3".

Porque isto é a Marvel. E a Marvel tem pontas por atar, "plot-holes" por preencher, uma Fase 4 a desenvolver e um espectáculo para dar. O que faz com que o guião mais singelo rapidamente seja triturado pela máquina do CGI.

Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis

Se por um lado, para aqueles que têm saudades do que foi feito em "Capitão América" e ainda pensam no pastiche que a série "Daredevil" fez da icónica cena de luta de "Oldboy" (Park-Chan Wook), "Shang-Chi" até nos traz as melhores cenas de combate corpo-a-corpo do universo cinematográfico Marvel. Mas por outro lado, o CGI apressado, principalmente no final, fosco e escurecido, atira-nos para o reino da fantasia e deixa-nos a nós e às suas personagens perdidos dentro do turbilhão.

Mas fiquemo-nos pelo melhor de "Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis". Cortesia do supervisor de acrobacias Brad Allan - antigo parceiro de Jackie Chan – aqui uma simples luta de rua eleva-se aos píncaros de energia hollywoodesca. Seja dentro de uma gaiola de combate, num andaime de construção (fãs de "Rush Hour", sorriam), ou dentro de um autocarro (a segunda este ano, depois da visceral cena de Bob Odenkirk em "Ninguém"), este filme ostenta a glória dos filmes de acção kung fu e wuxia, que acompanhado por uma montagem exímia, evoca toda uma cultura cinematográfica que vai desde Chang Cheh e King Hu, passando por Jackie Chan e Bruce Lee, até Zhang Yimou e Tsui Hark.

É caso para dizer que no MCU, através de uma personagem criada por Steve Englehart e Jim Starlin à imagem de Bruce Lee, cumpre-se um ciclo e abre-se um novo: Simu Liu ergue-se como nova estrela de acção e a personagem de Shang-Chi (que até começou na BD como filho desconhecido do malvado Fu Manchu) como um novo herói de artes marciais, de coração puro, capaz de se imbuir do seu passado e trilhar o seu caminho. Que provavelmente o levará rumo aos Vingadores.