Ao site Indiewire, Ciro Guerra afirmou que o reinado de droga de Pablo Escobar é visto como um período de ouro na História da Colômbia, mas que ao contrário do senso comum e de algum revivalismo trazido pela cultura popular colombiana e não só, deveria ser encarado como uma idade sombria na sua passagem do século XXI.

Em “Pássaros de Verão”, o que está em causa não é Escobar, e sim todo o movimento que gerou figuras como essas, ventos que contaminam todo uma tradição ancestral.

Dirigido a meias com a sua ex-mulher e produtora dos seus anteriores filmes, Cristina Gallego, “Pássaros de Verão” (projeto de sonho da dupla) sucede a “Abraço da Serpente” nessa jornada pelos povos indígenas e a sua “resistência” pela chegada do homem branco e da cultura ocidental.

Nesse filme, candidato aos Óscares de Melhor Filme Estrangeiro, o espectador era induzido a um simulacro da expedição pelo registo do último membro de uma tribo amazónica, um rito temporal o qual a Selva, o berço da civilização, metamorfoseava perante os primeiros indícios de “globalização”.

O registo que contraria atitudes de um pandemónio à lá Werner Herzog (“Fitzcarraldo”, 1982) terminaria numa viagem pelo xamanismo e a metafisica divinal. Essas tendências não são de todas restauradas, mas citadas neste “Pássaros de Guerra”, o tráfico de droga como sustentabilidade da tribo wayyu, um conto arquitetonicamente construído em cinco capítulos, que marca um conflito interno entre a “modernidade” e a ancestralidade.

E essas aves estivais são apenas animais amestrados pela domesticidade do Ocidente, perdendo pouco-a-pouco as ligações térreas com os antepassados e pelos espectros animalescos que outrora veneravam.

Contudo, no deserto hoje transposto no cinema criminal, “Pássaros de Verão” vai além do seu esteticismo quase jodorowskiano [relativo ao cineasta chileno Alejandro Jodorowski] e se confronta contra a normalização deste tipo de vida ilícita no meio cultural, o que, buscando o ponto inicial do “barão da droga” – Escobar - e a sua dicotomia ouro/sombra, é um chuto à popularidade da distorcida série “Narcos” e outros conteúdos “gringos”.

"Pássaros de Verão": nos cinemas a 20 de junho.

Crítica: Hugo Gomes

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