A HISTÓRIA: Cherry deixou a faculdade para servir no Iraque como médico do Exército. A sua única âncora é a namorada Emily. Quando regressa a casa como um herói de guerra, luta contra os demónios de um stresse pós-traumático não diagnosticado e torna-se viciado em heroína. Para sustentar o vício, começa a roubar bancos, destruindo pelo caminho a sua relação com Emily.

"Cherry": disponível na Apple TV+ a partir de 12 de março.


Crítica: Daniel Antero

Joe Russo e Anthony Russo são os realizadores responsáveis por "Vingadores: Endgame", que retirou a "Avatar" o título do mais lucrativo de todos os tempos nas bilheteiras em julho de 2019 (e que voltou a perder para o mesmo filme a 13 de março). Ou seja, a sua capacidade para serem épicos é exímia, desde as batalhas super-povoadas ao "timing" perfeito de um "beat" cómico. Mas essa nunca seria a melhor abordagem para um filme como "Cherry"...

Baseado no romance semi-autobiográfico de Nico Walker, "Cherry" é a história da decadência de um jovem (Tom Holland, o Homem-Aranha do Universo Marvel) que, após um período como médico do exército americano no Iraque, retorna a Cleveland, para se afundar em drogas e assalto a bancos.

Problema sistémico nos Estados Unidos, a adição e o trauma dos veteranos de guerra que regressam a casa sem propósito e com stresse pós-traumático é um tema sensível, com ressonância e coração. Mas os irmãos Russo pouco quiseram saber disso e com uma atitude verborreica, espampanante e prepotente, preferiram explorar esta crise e a psicologia da personagem Cherry com um registo altamente estilizado e intoleravelmente diversificado.

De ritmo confuso e floreados inconsequentes, enchem este drama de saltos, sequências "freeze-frame", câmara lenta, pontos de vista rectais (literalmente), alterações da proporção do ecrã e monólogos diretamente para o espectador para contarem uma narrativa previsível que nada acrescenta ao cânone de filmes onde pertencem "No Trilho da Droga", de Gus Van Sant (1989), "Grito de Revolta", de Scott Kalvert (1995) ou "A Vida não é um Sonho", de Darren Aronofsky (2000).

Com um prólogo, seis capítulos e um epílogo, o guião de Jessica Goldberg e Angela Russo-Otstot procura manter o ritmo e a continuidade nervosa do romance de Walker através da narração de Cherry em voz-off. Mas este, mais do que comentar os seus atos, descreve-os durante e depois de os realizar, não acrescentando profundidade ou tendo sequer utilidade.

A introdução pontual de humor negro como fuga ao miserabilismo niilista da personagem de Holland ainda nos mantém curiosos, mas o mecanismo auto-explicativo aliado à constante quebra estilística, retira-nos qualquer possibilidade de empatia emocional.

Videoclip de 141 minutos, "Cherry" é frustrante, vago e nem a seriedade e compromisso dos atores, que cravam a devastação nos seus corpos, são suficientes para o sarar da sua artificialidade.

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