A HISTÓRIA: Numa prisão em que os reclusos comem as sobras dos que se encontram nos pisos superiores, um homem tenta levar a cabo mudanças para que ninguém passe fome.

"A Plataforma": disponível na Netflix desde 20 de março de 2020.


Crítica: Hugo Gomes

A grande sensação da Netflix "A Plataforma" deseja ser um filme-alegórico que combina os elementos do cerco vistos e revistos desde “Cubo” (Vincenzo Natali, 1997) e os derivativos que se seguiram e prolongaram até aos nossos dias.

O que adensa o mistério conceptual desta longa-metragem de estreia de Galder Gaztelu-Urrutia, vencedora do Festival do Cinema Fantástico de Sitges, é uma previsível tese da instituída pirâmide social.

Aqui, numa espécie de “não lugar”, encontramos uma coluna edificante, dividida em mais de 200 pisos, com pequenas celas de dois residentes (prisioneiros ou voluntários) que, todos os dias, se alimentam através de um "buffet" cuidadosamente preparado numa plataforma que vai de cima para baixo.

Por outras palavras, os dos pisos de cima empanturram, os do meio colhem as sobras e os de baixo … bem, tentam manter-se vivos. E este é um sistema que constantemente procura a sua sustentabilidade, nem que para isso tenha que alterar mês a mês a posição dos seus "hóspedes".

Inspirado na alegoria das Colheres Longas, onde o saciar da fome se consegue graças à entreajuda, "A Plataforma" é essa tentativa de descodificar o armadilhado processo de distribuição, que se torna o "conflito" de uma obra atmosférica que se mantém devidamente presa aos lugares-comuns deste tipo de exercícios cinematográficos.

Para tornar as “coisas” menos interessantes, o clímax é povoado do mesmo material de muitos desses filmes, inclusive num final em aberto, críptico e demasiado dependente da imaginação do espectador.

Dito isto, "A Plataforma" pode não ser "revolucionário", mas tem ideias políticas, sociais e éticas “deliciosas” e provocadoras. Como iguaria, não é coisa pouca...