A HISTÓRIA: Dom Cobb é um talentoso ladrão, o melhor na arte da extração: ele rouba segredos e ideias às pessoas diretamente das profundezas das suas mentes, durante os sonhos – estado em que a nossa mente está mais vulnerável. A rara habilidade de Cobb fez dele uma das pessoas mais influentes neste novo mundo de espionagem empresarial, mas também um fugitivo internacional e custou-lhe tudo o que já amara. Mas agora foi-lhe oferecida uma oportunidade para se redimir. Um último trabalho pode devolver-lhe a sua antiga vida. Em vez do assalto perfeito, Cobb e a sua equipa de especialistas têm exatamente de fazer o inverso: instalar uma ideia na mente de alguém.

"A Origem": reposição nos cinemas a 13 de agosto.


Crítica: Hugo Gomes

A regressar aos cinemas antes da estreia do novo "Tenet", o primeiro "blockbuster" da era COVID-19, “Inception” (“A Origem”) parte da extensão de um certo gesto autoral vindo do realizador Christopher Nolan, que dentro de um sistema industrial megalómano tem vindo a demonstrar um toque pessoal conciso na ressurreição da grande produção "hollywoodesca", que vem da trilogia “O Cavaleiro das Trevas”.

Estamos a referir-nos à sua temática de tempo & memória, aqui evidentemente esboçada no contexto dos sonhos servidos de objetivo a um mímico "filme de golpe". E assim começamos com o plano engendrado num elenco de luxo (Leonardo DiCaprio, Cillian Murphy, Marion Cotillard, Elen Page, Michael Cane, Tom Hardy, Joseph Gordon-Levitt, Ken Watanabe), que funciona no seu coletivo enquanto Nolan trabalha para lhes conceder um cenário de ação física e hiperativa, jogando igualmente com as equações matemáticas que se difundem na narrativa.

Passados 10 anos, “A Origem” continua a demonstrar a força convicta de uma produção arriscada, de um uso generoso de efeitos visuais (nunca cedendo à artificialidade computorizada) e da banda sonora de fulgor épico-pop, como parece ser habitual vindo da assinatura de Hans Zimmer. Não nos enganemos: esta megaprodução opera os lugares cobiçados do cinema espetáculo a grande escala, mas assume essa grandeza sem nunca perder um norte.

Há uma década, vimos em “A Origem” um tipo de ensaio operático que não se testemunhava há “séculos” na Sétima Arte. Chegou no preciso momento em que o facilitismo entrou porta adentro na cadeia produtiva (sublinhamos a “pornografia” CGI, mas também a exploração do filão 3D pós-"Avatar"), com os autores no cinema, estivessem ou não sincronizados com as tendências de público, a serem esmagados pelos ditames do marketing planeado por comités anónimos.

Nesse sentido, é fácil de encontrar o ponto de fascínio deste tremendo "blockbuster" que é "A Origem": nunca ceder à padronização do espectador e tentar, mesmo dentro dos acordes do que encaramos como espetáculo, criar um exercício de engenho pronto a ser interpretado ou encriptado.

O seu dúbio final continua a suscitar debates, teorias e fórmulas para o tentar decifrar. Ao fim destes anos, não tenhamos dúvidas que o filme mantém o seu impacto, nos espectadores e na indústria, uma raridade que se destaca entre as cada vez mais débeis produções de grande escala das "majors" de Hollywood.

Sem negar a importância de “A Origem” no rumo do cinema atual (na conceção circense ou meramente na moldável natureza da indústria, além da estética de epopeia agora cobiçada até à sua exaustão), como aconteceu com o "Tubarão" de Spielberg há 45 anos, Christopher Nolan revolucionou uma forma de se fazer e vender filmes para massas, sem nunca desprezar o seu intelecto.

Essa tem sido a sua grande obra, mesmo que o ego tenha caído para a exibição pura nas posteriores “escapadelas” por diferentes géneros, da ficção espacial de “Interstellar” ao bélico frenético de “Dunkirk”. No balanço, “A Origem” continua a ser um dos belíssimos "blockbusters" do século XXI.